terça-feira, 30 de março de 2010

Passeando pelo 25 de Março

No último dia 25 de março, o presidente Lula recebeu uma homenagem da comunidade árabe pelos serviços prestados à aproximação entre o País e o Mundo Arabe. Desde o início do governo Lula o intercâmbio comercial entre o Brasil e os países árabes aumentou 167%.
No evento, Lula recebeu o Grande Colar da Ordem do Mérito da Câmara de Comércio Árabe Brasileira das mãos de seu presidente, Salim Schahin. E ainda foi presenteado com um exemplar do Alcorão traduzido para o português, com "A Grande Faixa", comenda entregue pela primeira vez a uma autoridade brasileira, que ele recebeu do arcebispo metropolitano da Igreja Ortodoxa em São Paulo, Damaskinos Mansour, e com um presente do Conselho dos Embaixadores Árabes no Brasil. Já a primeira-dama, Marisa Letícia, recebeu uma benção na forma de ícone de Nossa Senhora.

Desde o início de seu primeiro mandato, em 2003, Lula definiu como prioridade a aproximação do Brasil com o mundo árabe. Naquele mesmo ano ele se tornou o primeiro presidente brasileiro, no exercício do cargo, a visitar a região. Viajou para o Líbano, Síria, Egito, Emirados Árabes Unidos e Líbia, e lançou a idéia de realizar a Cúpula América do Sul-Países Árabes (Aspa), cuja primeira edição ocorreu em 2005, em Brasília, e a segunda no ano passado, em Doha, no Catar. O terceiro encontro está programado para ocorrer em 2011, em Lima, no Peru.

Depois do primeiro giro pelo Oriente Médio, o presidente esteve também na Argélia, Arábia Saudita, mais uma vez na Líbia, para participar como convidado da Cúpula da União Africana, no Catar, para a 2ª Cúpula Aspa, e mais recentemente na Palestina e na Jordânia. Em maio ele voltará ao Catar para retribuir a visita que o emir Hamad Bin Khalifa Al-Thani fez ao Brasil em janeiro.

Sobre a última viagem, que incluiu também Israel, Schahin, que acompanhou o presidente na Palestina e Jordânia, disse que a receptividade foi “excepcional”. “Os frutos dessa viagem serão o aumento dos negócios, das relações políticas e culturais”, ressaltou. “E também para o processo de paz [entre israelenses e palestinos], que o Brasil, por meio do presidente Lula, deseja contribuir”, acrescentou.

Na seara econômica, as exportações brasileiras ao mundo árabe saíram de US$ 2,76 bilhões em 2003, segundo dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), para o pico de US$ 9,82 bilhões em 2008, e ficaram em US$ 9,4 bilhões em 2009, ano de crise e de retração no comércio exterior. Este ano, os negócios já voltaram a crescer. No primeiro bimestre, os embarques do Brasil ao mundo árabe renderam US$ 1,37 bilhão, um aumento de 33% sobre o mesmo período do ano passado.

25 de Março

Mas por que a homenagem no dia 25 de março? Bom, desde 2008, por força de lei aprovada no Congresso Nacional, a data marca o Dia Nacional da Comunidade Árabe. Para quem gosta de efemérides, 25 de março, no Brasil, é originalmente o Dia da Constituição, pois nesta data, em 1824, foi outorgada a primeira Constituição brasileira pelo imperador Dom Pedro I.
Mas 25 de Março é também o nome da mais famosa rua de comércio popular de São Paulo e onde muitos imigrantes árabes se estabeleceram. “O dia 25 de março é muito vinculado à colônia árabe, pois dá nome à rua que é conhecida no Brasil inteiro como ‘a rua dos árabes’”, disse o senador Romeu Tuma (PTB-SP), autor do projeto que criou o Dia Nacional da Comunidade Árabe.

Tuma, filho de pai sírio e mãe descendente de libaneses, faz parte dos 10% de parlamentares do Congresso Nacional que são de origem árabe. A comunidade é forte na política e conta ainda com cinco ministros no gabinete do presidente Lula.

A história da família de Tuma é parecida com as de muitos dos membros da colônia, hoje estimada em cerca de 12 milhões de pessoas. Seu pai iniciou a vida no Brasil como comerciante, vendendo mercadorias pelo interior, e depois se estabeleceu na 25 de Março com uma loja de armarinhos, tecidos e roupa de cama, mesa e banho.

O pesquisador norte-americano Clark Knowltown, em estudo sobre a imigração árabe no Brasil, fez levantamento estatístico indicando que em 1871, dois imigrantes com passaporte turco entraram no país, seguidos por outros oito em 1872, vinte e um em 1874, quinze em 1877, seis em 1880 e trinta e oito em 1881. Porém, segundo o diplomata saudita Mansour Saleh Al-Safi, que cita tal pesquisa em seu livro Arábia Saudita: Política Externa e Aspectos de sua Relação com o Brasil

"Apenas em 1892 as autoridades brasileiras começaram a registrar corretamente as nacionalidades, Aparecendo naquele ano 93 sírios como imigrantes e 196 outros em 1895.Até o final do século, 2.110 imigrantes do Oriente Médio tinham chegado ao Brasil, quer fossem eles registrados como “turcos”, ou sírios, libaneses, armênios, egípcios, marroquinos e argelinos, chegando aquele autor ao total de 106.184 imigrantes de 1871 a 1942."

Contudo, não devemos depositar confiança absoluta nestes dados, pois é fato bem conhecido que não só árabes viviam sob domínio turco e, portanto, outras etnias também portavam o passaporte turco. Muitos judeus vieram para o Brasil com tal documento, o que fez com que o povo os confundisse, e que a comunidade árabe tivesse que sofrer com a pecha muitas vezes imputadas aos judeus de “assassinos de Jesus”.
A propósito, o elemento religioso é muito importante para entendermos a imigração árabe. No final do século XIX, ela era quase toda cristã. Vivendo em países onde eram minorias, sentiam-se atraídos por países que unissem o Cristianismo como religião majoritária e a possibilidade de enriquecimento.
Por volta de 1890, o número de cristãos já era grande o suficiente para que se fizesse necessária a presença de padres do rito maronita e da Igreja Ortodoxa. E em 1896, um rabino sírio viria para fundar a primeira sinagoga carioca. Os muçulmanos árabes só fundariam a primeira mesquita quase cinco décadas depois, embora o Islã já tivesse chegado ao Brasil no final do século XVII, através dos escravos maleses.

Ao contrário de outras colônias como a alemã, que se fixou no sul do Brasil, e a italiana que radicou-se predominantemente em São Paulo, os árabes, não se fixaram em lugar algum. A dispersão árabe pelo Brasil acompanha os ciclos econômicos do País. Durante o ciclo da borracha, foram à Amazônia vender seus produtos aos barões locais. Quando foi a vez do café, seguiram rumo à São Paulo, Paraná e Mato Grosso. Revolucionaram o comércio popular com novidades para a época, como vendas à prazo e liquidações.
A maioria dos imigrantes era formada por moradores do campo ou lavradores, mas com uma multissecular experiência em negociar e intermediar vendas, preferindo atuar no que parecia mais propício à obtenção de lucros rápidos com os quais pretendiam voltar à seu pais de origem, pois nessas primeiras levas,o imigrante não considerava definitiva sua vinda ao Brasil.

Com o colapso do Império Otomano, ao final da Primeira Guerra Mundial, muitos retornam à sua terra, alimentando o ideal de ver o oriente médio livre. Porém, a decepção é grande. Inglaterra e França partilham a região entre si. A França ficou com Síria e Líbano, a Inglaterra com a Jordânia (então chamada Transjordânia) e Iraque. A Palestina ganhou o duvidoso status de “protetorado britânico”. Os árabes não estavam livres, mas apenas submetidos a um novo senhor. A partir deste ponto, a imigração deixa de ter caráter provisório. Abandonam o sonho de retornar ricos à sua terra e passam a buscar um lar definitivo na América. Os novos imigrantes encontravam os pioneiros já estabelecidos no comércio atacadista. Estes forneciam-lhes mercadoria e know-how para trabalhar na nova terra.

Alem de sírios e libaneses, houve outra imigração, bem mais recente, a dos palestinos, ocorrida a partir da década de 1970, portanto pouco após a ocupação dos territórios palestinos por forças israelenses, e de distúrbios ocorridos na Síria e no Líbano. Embora este movimento de refugiados palestinos já existisse desde a criação de Israel, em 1948, é depois da Guerra dos Seis Dias, que este se intensifica. Muitos desses palestinos fixaram-se em São Paulo, Porto Alegre e no Distrito Federal.

Entre os imigrantes do século XX, estavam professores, jornalistas, escritores, etc. Durante o Estado Novo, surgiu uma associação de escritores árabes chamada “Nova Andaluzia”, que teve que ser extinta devido à política xenófoba do governo Vargas. Também na vida pública os árabes se destacaram. Nomes como o de Francisco Rezek, Antonio Kandir, Ibrahim Eris, Espiridião Amin,José Richa e o já citado Romeu Tuma, dentre outros, destacaram-se na política nacional e demonstram a mobilidade social que o imigrante árabe obteve neste país. Com um segmento populacional tão significativo, composto por imigrantes bem sucedidos nos negócios e na política, é natural observar que o Brasil mantêm relações comerciais com o mundo árabe desde o aparecimento das nações árabes modernas.
No próximo post falaremos sobre essas relações...

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