segunda-feira, 2 de agosto de 2010

O Convite de Ahmadinejad

É curioso observar o discurso das agências de notícias. A mesma notícia pode ser dada com um enfoque de acordo com o interesse de quem dá a notícia,como na célebre piada do cão que morde o corintiano ou o árabe ou quem quer que a pessoa que a conte queira gracejar. O cão pode ser o algoz ou vítima de acordo com as circunstâncias.
Da mesma forma podemos analisar o noticiário acerca da proposta do presidente Mahmoud Ahmadinejad de participar de um debate televisivo com Barack Obama. A Reuters noticiou como um desafio,uma fanfarronice,mas não mencionou um pequeno detalhe: na véspera o Irã havia sido ameaçado de ataque militar pelo chefe do Estado Maior norte-americano Michael Mullen. Da mesma forma o Irã vem alardeando que o acordo trilateral assinado em maio com Turquia e Brasil continua valendo.
Trata-se de um desafio ou de uma tentativa desesperada (embora bem disfarçada) de evitar um ataque militar?

domingo, 18 de julho de 2010

Um exemplo de realpolitik

Há no mundo todo 1,3 bilhão de muçulmanos. Destes,apenas 18% são árabes. Os demais são turcos,indianos,paquistaneses,europeus,chineses,americanos e...persas ou iranianos. A rivalidade entre persas e árabes é milenar. Esta rivalidade já existia desde antes do surgimento do Islã,mas neste período o Império persa era poderoso e os árabes um grupo de nômades desorganizados e desunidos. O Islã unificou os árabes sob uma única língua e religião e o que ocorreu daí por diante foi uma das mais assombrosas expansões da História: menos de um século após o falecimento do profeta Muhammad (Maomé) o Islã já se constituía um império que ia da Espanha até a China. Quando chegaram a Pérsia,os árabes encontraram resistência,embora a princípio os persas tenham adotado a versão sunita do Islã,majoritária até hoje,contando com 85% dos muçulmanos. Apenas no século XVI a Pérsia de torna xiita,quando a dinastia safávida chega ao poder. Estudiosos como Stephen Kinzer afirmam que a opção xiita dos persas era uma maneira de aceitar a religião trazida pelos estrangeiros,mas em sua versão "rebelde". Na verdade não é tão simples assim: o Islã xiita guarda grandes semelhanças com a religião original da Pérsia que é o zoroastrismo:bastante emocional,dualística e fundada em líderes carismáticos. Zaratustra no zoroatrismo Muhammad e Ali no xiismo.
Desde então a rivalidade entre persas (iranianos desde 1935) e árabes só fez crescer.
O artigo publicado anteontem na publicação alemã "Der Spiegel",mostra que há um alinhamento entre os conservadores governos árabes e a linha mais à direita do atual governo israelense. A solidariedade entre muçulmanos só existe entre os cidadãos comuns e nos pronunciamentos oficiais. No mundo da política real,as coisas são bem diferentes,com podemos ver a seguir:

"Israel e os Estados árabes próximos ao Golfo Pérsico reconhecem uma ameaça comum: o regime de Teerã. Um diplomata da região sequer descartou apoio por parte dos Estados árabes a um ataque militar com o objetivo de acabar com as ambições nucleares do Irã.

A manhã começou há pouco no cais em Sharjah, que fica logo abaixo do Museu da Civilização Islâmica, e onde os pesados navios de madeira conhecidos com dhows estão sendo carregados. Trabalhadores paquistaneses levam blocos de motores, monitores de plasma e óleo mineral para os porões dos navios. Quando lhes perguntam para onde os dhows estão seguindo, eles dizem, tranquilamente: “Para o Irã”.

O comércio entre os Emirados Árabes Unidos e o seu vizinho que fica do outro lado do Estreito de Hormuz é uma ocorrência diária tão trivial que mal merece ser mencionada nas docas.

As mesmas famílias frequentemente possuem membros em ambas as costas do estreito. O relacionamento comercial entre elas cresceu no decorrer de gerações e são mais duradouras do que qualquer guerra ou embargo comercial.

É claro que o envio de blocos de motores para o cidade portuária iraniana de Bandar-e Lengeh não é proibido. Mas a movimentada atividade de importação e exportação nos cais de atracação dos dhows nos emirados de Sharjah, Dubai e Ras al-Khaimah demonstram como é difícil isolar Teerã.

“Incrivelmente honesto”

Isso torna ainda mais interessantes as palavras proferidas na terça-feira pelo embaixador dos Emirados Árabes Unidos nos Estados Unidos, Yousef Al Otaiba, em Aspen, no Estado do Colorado, que fica mais de 12.500 quilômetros a oeste do Golfo Pérsico. Otaiba participava de um fórum no Festival de Ideias do Instituto Aspen, e o clima era de tranquilidade, ou pelo menos era excessivamente relaxado para o padrão diplomático.

A discussão girava em torno do Oriente Médio. Quando lhe perguntaram se os Emirados Árabes Unidos apoiariam um possível ataque aéreo israelense contra o regime de Teerã, o embaixador Otaiba respondeu: “Um ataque militar contra o Irã, desfechado por qualquer país, seria um desastre, mas um Irã com uma arma nuclear seria um desastre ainda maior”.

Estas foram palavras incomumente honestas. “Um ataque militar sem dúvida provocaria uma retaliação. Haveria problemas, com populações protestando e se rebelando, e se mostrando extremamente insatisfeitas com o fato de uma força militar estrangeira atacar um país muçulmano”, disse Otaiba.

Mas, ele acrescentou: “Se você me perguntar se eu prefiro um quadro como este ou um Irã nuclear, a minha resposta será a mesma. Nós não podemos conviver com um Irã nuclear. Eu estou disposto a absorver tudo o que ocorrer em nome da segurança dos Emirados Árabes Unidos”.

A parlamentar norte-americana do Partido Democrata, Jane Harman, disse depois que nunca ouviu algo como isso de uma autoridade de um governo árabe. “Otaiba foi incrivelmente honesto”, acrescentou Harman.

“Apesar da natureza chocante das suas declarações, Otaiba estava apenas expressando, em um fórum público, a posição de muitos países árabes”, afirma o especialista em Oriente Médio Jeffrey Goldberg, que escreve para a revista “The Atlantic Monthly”, e que foi o moderador do painel de discussões em Aspen.

O fato de alguns políticos ocidentais não estarem familiarizados com essa posição tem a ver com a própria ignorância deles, e com a habilidade diplomática com a qual os menores Estados da região do Golfo Pérsico, em particular, foram capazes de ocultar até agora a sua oposição ao seu poderoso vizinho.

“Os judeus e os árabes estão brigando há cem anos. Mas os árabes e os persas brigam há mil anos”, argumenta Goldberg no site da “The Atlantic Monthly”.

Quase todos os vizinhos árabes mantêm uma relação hostil com a república islâmica. A Arábia Saudita suspeita que o Irã esteja atiçando a minoria xiita nas suas províncias orientais. Os emirados árabes acusam o Irã de ter ocupado três ilhas no Golfo Pérsico. O Egito não mantém relações diplomáticas regulares com o Irã desde que uma rua em Teerã foi batizada com o nome do assassino do ex-presidente egípcio Anwar el-Sadat.

O rei da Jordânia, Abdullah II, faz advertências quanto ao estabelecimento de um “crescente xiita” entre o Irã e o Líbano. E o Kuait, temendo os iranianos, instalou o sistema de defesa antimísseis norte-americano Patriot no segundo trimestre deste ano.

Estreitamente alinhados

Os governos árabes estão preocupados com um Irã forte, com o programa nuclear iraniano e com os discursos incendiários do presidente iraniano Mahmoud Ahmadinejad. Eles compartilham essas preocupações com um outro governo do Oriente Médio – o governo de Israel.

Nunca antes os interesses estratégicos dos Estados árabes e judeu estiveram tão estreitamente alinhados. Enquanto especialistas em segurança europeus e norte-americanos caracterizam sistematicamente um ataque militar contra o Irã como “um último recurso”, autoridades árabes há muito compartilham as ideias do ministro do Exterior ultranacionalista de Israel, Avigdor Lieberman. “Se ninguém assumir a tarefa de bombardear o Irã, Israel terá que fazer isso”, disse a “Spiegel” o clérigo saudita Mohsen al-Awaji. “A agenda de Israel tem os seus limites”, afirmou al-Awaji, observando que Israel está preocupado principalmente em assegurar a sua existência nacional. “Mas a agenda do Irã é global”.

Às vezes essa agenda leva a ações que são tão absurdas quanto típicas. Em fevereiro, por exemplo, Teerã baixou uma proibição de aterrissagens contra todas as companhias aéreas que utilizarem o termo “Golfo Árabe” em vez de “Golfo Pérsico” nos seus programas de bordo.

Mas os países árabes estão exercendo uma delicada política de vai-e-vem. Os Emirados Árabes Unidos não têm condições de ofender publicamente o Irã, o que explica por que o embaixador Otaiba recebeu imediatamente a ordem de retornar para casa na última quarta-feira.

Essa cautela apenas oculta a profunda divisão existente entre os árabes e os persas. Apesar das suas manifestações públicas de indignação com as ações israelenses, como por exemplo o bloqueio militar à Faixa de Gaza, os países árabes da região continuam a seguir a sua rota pragmática. Em 12 de junho, o jornal “The Times” de Londres noticiou que a Arábia Saudita havia recentemente “conduzido testes para desativar as suas defesas aéreas a fim de permitir que jatos israelenses desfechassem um bombardeio contra as instalações nucleares do Irã” - na eventualidade de um ataque israelense contra a usina nuclear localizada em Bushehr. E, em março, agências de inteligência ocidentais anunciaram que havia sinais de negociações secretas entre Jerusalém e Riad no sentido de discutir essa possibilidade.

“Nós estamos alinhados com os Estados Unidos em todas as questões políticas no Oriente Médio”, disse em Aspen o embaixador Otaiba.

Pragmatismo e mudanças de alianças

“Os Emirados Árabes Unidos optaram por se alinhar ao campo daqueles que apoiaram a carta da nova resolução da Organização das Nações Unidas (ONU) de 9 de junho”, escreveu o filósofo francês Bernard-Henri Lévy, observando que isso se constituiu em “um verdadeiro golpe para o regime do Irã”. Para Lévy, a “union sacrée” de países muçulmanos contra o “inimigo sionista” é uma fantasia. Ele acrescentou que os países que se sentem ameaçados por Teerã têm agora a oportunidade de formar uma aliança de conveniência.

Além da Jordânia, os Emirados Árabes Unidos são o único país árabe que possui soldados servindo no Afeganistão – lutando ao lado dos Estados Unidos. Abu Dhabi, o mais rico dos sete emirados, estaria pressionando Dubai para manter sob cerrada vigilância os vários iranianos influentes que vivem lá.

No final de junho, o banco central dos Emirados Árabes Unidos congelou 41 contas bancárias, e descobriu-se que algumas delas estariam diretamente vinculadas à Guarda Revolucionária do Irã. As contas estariam sendo utilizadas para realizar transações vinculadas ao contrabando de materiais contidos na lista de embargo contra o Irã.

Antes disso, os Emirados Árabes Unidos anunciaram um controle mais rígido sobre os navios na zona de livre comércio de Dubai. “Forças de segurança interditaram vários navios suspeitos de transportar cargas ilícitas”, afirmou Hamad Al Kaabi, o representante permanente dos Emirados Árabes Unidos junto à Agência Internacional de Energia Atômica.

As nações árabes do Golfo Pérsico estão seguindo uma realpolitik nas suas relações com o Irã. Quando ficam em dúvida, elas pulam para o lado dos norte-americanos, mas preferem seguir a rota da negociação e do comércio. O líder de um emirado do Golfo Pérsico disse recentemente a uma delegação de políticos europeus: “A melhor forma de lidar com os iranianos é fazendo negócios com eles”.

domingo, 27 de junho de 2010

Os EUA se perguntam: o que fazer com Israel?

Alguns tópicos são tão inflamatórios que nunca são discutidos sem que primeiro seja feita uma série de advertências. E, assim, quando Anthony Cordesman, um estudioso de política externa de Washington, publicou um artigo na quarta-feira intitulado "Israel como um Problema Estratégico", fez questão de abrir o texto com uma série de explicações.

Primeiro, observou, o compromisso americano com Israel tem motivos morais e éticos - uma reação ao Holocausto, ao antissemitismo de países ocidentais e à resistência americana em entrar na II Guerra Mundial, o que permitiu o extermínio dos judeus pelos nazistas. Em segundo, Israel é uma democracia com os mesmos valores que os EUA. Terceiro, os EUA jamais abandonarão Israel, sempre o ajudando a manter sua vantagem militar sobre seus vizinhos. E Washington protegerá Israel contra uma ameaça nuclear iraniana.
Mas, assim que acabou de expor o que no jornalismo é conhecido como "parágrafos de garantia", Cordesman apresentou um argumento que tem ganhado espaço em Washington - dentro do governo de Obama (incluindo Casa Branca, Pentágono, Departamento de Estado) e fora, em fóruns e encontros políticos. Governos israelenses recentes, particularmente o do primeiro-ministro Benyamin Netanyahu, alegou Cordesman, têm ignorado as preocupações de segurança nacional de seu maior benfeitor, os EUA, e têm adotado medidas que prejudicam os interesses americanos no exterior.


"A profundidade do compromisso moral de Washington não justifica nem desculpa ações de um governo israelense que desnecessariamente torna Israel um problema estratégico quando o país deveria continuar a ser um trunfo", escreveu Cordesman em comentário para o Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais. "Já é tempo de Israel perceber que tem obrigações com os EUA, assim como os EUA têm com Israel, e se tornar muito mais cuidadoso na forma como testa os limites da paciência dos EUA e explora o apoio dos judeus americanos."

A lista de iniciativas recentes do governo de Netanyahu que constituem uma ameaça potencial aos interesses americanos tem aumentado de forma constante, segundo muitos peritos em política externa. A violência que explodiu quando patrulhas israelenses invadiram barcos da flotilha que seguia para a Faixa de Gaza em 31 de maio esfriou as relações americanas com um aliado-chave muçulmano, a Turquia. A disputa na Faixa de Gaza também torna mais difícil que os EUA consigam formar uma coligação que inclua Estados árabes e muçulmanos contra as ambições nucleares do Irã. A recusa de Netanyahu de interromper a construção de habitações judaicas em Jerusalém Oriental também prejudica as relações americanas com aliados árabes. Tudo isso torna ainda mais difícil alcançar um eventual acordo de paz, que muitos oficiais do governo acreditam ser fundamental para os interesses dos EUA.

O presidente Barack Obama e o general David H. Petraeus, recém-empossado chefe das operações militares dos EUA no Afeganistão, falaram nos últimos meses sobre a ligação entre o contínuo conflito entre israelenses e árabes e os interesses de segurança dos americanos. Durante uma coletiva de imprensa em abril, Obama declarou que esses conflitos no Oriente Médio acabaram "custando significativamente em termos de sangue e tesouros"; além disso, ele fez uma ligação explícita entre a disputa israelo-palestina e a segurança dos soldados americanos enquanto combatem extremistas islâmicos no Iraque, Afeganistão e outros locais.

Petraeus abordou o tema num recente discurso ao Congresso norte-americano, dizendo que a falta de progressos no Oriente Médio cria um ambiente hostil para os EUA. Após causar furor entre os presentes, ele explicou que não queria dizer que os soldados são colocados em risco pelo apoio dos EUA a Israel, fazendo um grande esforço para salientar a importância da parceria estratégica com Israel. "Mas o status quo atual é insustentável", afirmou. "Se não obtivermos progresso em uma paz justa e duradoura no Oriente Médio, os extremistas terão espaço para nos perseguir."

Recentemente,Benyamin Netanyahu anunciou a construção de novos assentamentos judaicos na Cisjordânia. Segundo o Direito Internacional construir assentamentos em territórios ocupados militarmente é ilegal,mas o governo israelense segue construindo essas colônias impunemente há décadas. No início de seu governo, Obama se manifestou firmemente contra a expansão destas colônias, mas a atitude de Israel até agora tem sido a de ignorar solenemente o presidente norte-americano e a opinião pública mundial. Israel se isola casa vez mais confiando na força de suas armas e de seu lobby em Washington.Resta saber o que acontecerá quando as atitudes de Bibi realmente se chocarem com os interesses norte-americanos na região.

terça-feira, 22 de junho de 2010

Frase do dia

"Queimamos os dedos fazendo coisas que todo mundo dizia serem úteis e, no fim das contas, descobrimos que algumas pessoas não aceitavam 'sim' como resposta",(Celso Amorim ao jornal inglês Financial Times em referência ao estímulo que o Brasil recebeu dos EUA para negociar com o Irã e o posterior recuo de Obama.)

terça-feira, 15 de junho de 2010

ONU distribuirá em Gaza ajuda de navios apreendidos por Israel

NAÇÕES UNIDAS (Reuters) - A Organização das Nações Unidas (ONU) concordou em distribuir na Faixa de Gaza a ajuda humanitária levada por três navios apreendidos por Israel em 31 de maio e teve o consentimento de Israel e dos proprietários turcos para realizar a operação, disse um enviado da entidade nesta terça-feira.

A Marinha israelense assumiu o controle do comboio de seis navios que tentava furar o bloqueio imposto por Israel à Faixa de Gaza e forçou que as embarcações atracassem em portos israelenses. Nove ativistas morreram em um dos navios, o que provocou uma forte condenação internacional. Israel afirma que seus comandos agiram em defesa própria.

O enviado da ONU para o Oriente Médio, Robert Serry, disse ao Conselho de Segurança que a entidade está pronta para assumir a responsabilidade de entregar os produtos "em bases excepcionais".

O órgão "obteve o consentimento dos proprietários... para assumir a posse e a responsabilidade por todo o carregamento e garantir sua distribuição a tempo em Gaza para propósitos humanitários como determinado pelas Nações Unidas", disse Serry durante relatório mensal sobre o Oriente Médio.

"O governo de Israel concordou em liberar todo o carregamento para as Nações Unidas em Gaza, mais uma vez no entendimento que é para as Nações Unidas determinar seu uso humanitário apropriado em Gaza", acrescentou.

Israel impôs um bloqueio à Faixa de Gaza desde que o Hamas assumiu o território, há três anos, permitindo apenas a entrada do que considera produtos essenciais.

A agência da ONU para refugiados palestinos coordena um enorme programa de ajuda e educação em Gaza.

Serry afirmou que a ONU iniciará a distribuição dos produtos o mais rápido possível.

(Reportagem de Patrick Worsnip)
Fonte: http://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/reuters/2010/06/15/onu-distribuira-em-gaza-ajuda-de-navios-apreendidos-por-israel.jhtm

quarta-feira, 9 de junho de 2010

Sobre as novas sanções

O Conselho de Segurança da ONU aprovou o novo pacote de sanções contra o Irã promovido pelos Estados Unidos na reunião desta quarta-feira (09/06), por 12 votos a favor, dois votos contrários - dados por Brasil e Turquia - e uma abstenção (Líbano). O voto brasileiro lembrou o acordo fechado com o governo iraniano no dia 17 de maio, que prevê troca de combustível nuclear sob fiscalização internacional, para defender a opção pela via diplomática e justificar a oposição a medidas punitivas.
Brasil e Turquia foram coerentes. Após o acordo obtido em Teerã não poderiam aprovar sanções criadas por um grupo que simplesmente ignorou o acordo.
As sanções que atingem principalmente os bancos nacionais e os Pasdaran (a Guarda Revolucionária),não atingem o ponto nevrálgico da economia iraniana que é o refino de petróleo para obter gasolina realizado pela China que obviamente condicionou sua aprovação as sanções se este ponto não fosse tocado.
Na prática o acordo trilateral Brasil-Turquia-Irã foi jogado no lixo,o que é lamentável,pois era uma chance de o diálogo prevalecer.De qualquer forma, Brasil e Turquia marcaram sua posição e continuarão a ser atores importantes no teatro das relações internacionais.
Quanto ao anúncio de Teerã de que vai continuar enriquecendo urânio, nada mais natural,já que é signatário do TNP e tem direito a isso.
Estou bastante pessimista em relação a uma resolução a esta questão. Temos dois casos clássicos de embargos que não resultaram em nada: Cuba e Iraque.
O primeiro depauperou a ilha mas não derrubou Fidel,que só entregou o poder por motivos de saúde a seu irmão Raul Castro quando e como quis. No caso do Iraque foi muito pior: após a invasão de 1991, o país árabe passou por um embargo asfixiante, que impedia a importação de cadarços de tênis e leite em pó que na mente doentia dos idealizadores das sanções poderiam ser usados na fabricação de armas.
As sanções ao Iraque empobreceram o país a tal ponto que o país quase não possuía água potável e remédio simples para curar a desidratação e a diarreia que matou cerca de 500.000 crianças. A secretária de Estado Madeleine Albright disse que este era um preço que ela estava disposta a pagar.
O Irã não está enfraquecido como o Iraque e pode suportar as sanções por algum tempo. Resta saber quais as reais intenções do Ocidente: fazer com que o Irã desista de seu programa nuclear,tarefa quase impossível pois ele é apoiado por todos os setores da sociedade, inclusive o tão decantado "movimento verde" ou enfraquecer o país preparando o terreno para uma nova invasão e um novo atoleiro.Há pessoas que não aprendem mesmo...

Brasil teme que sanções ameacem comércio bilateral com o Irã

A preocupação do presidente Lula em evitar sanções ao Irã vai além da negociação nuclear e de seu status na diplomacia internacional.

O temor do Brasil é que, aprovadas pelo conselho de segurança da ONU, essas retaliações também afetem diretamente o comércio entre os dois países.

A componente comercial da defesa do acordo nuclear entre Brasil, Irã e Turquia ficou claro nas conversas de Lula com seus ministros no voo de volta da viagem ao país persa.

Segundo a Folha apurou, Lula comemorou com seus ministros o impacto do acordo nas exportações brasileiras. "Nossas relações comerciais com o Irã vão crescer e muito com esse acordo", disse o presidente à comitiva no retorno ao Brasil.

Chefe da missão empresarial que acompanhou Lula na viagem ao Irã, o ministro Miguel Jorge (Desenvolvimento, Indústria e Comércio) admitiu à Folha a importância comercial de evitar sanções contra o Irã.

"Evitar sanções terá um efeito econômico importante para o Brasil", afirmou o ministro, citando que contratos celebrados com os iranianos poderiam ser afetados principalmente pelos riscos de bloqueio de pagamentos de exportações.

Contratos

Durante a visita de Lula, 64 empresas participaram de contatos com cerca de 250 empresas iranianas. Foram fechados negócios que vão representar exportações de US$ 7,7 milhões. Além disso, há ainda a previsão de US$ 61 milhões de contratos em negociação.

Além disso, empreiteiras brasileiras que participaram da missão, como Queiroz Galvão, Andrade Gutierrez e OAS, têm interesses em obras naquele país. O ministro Márcio Zimmerman (Minas e Energia) disse à Folha que há negociações para parcerias na construção de uma usina de 2 mil megawatts no Irã, de porte médio.

Miguel Jorge disse que hoje boa parte dos pagamentos de exportações brasileiras ao Irã é feita via Dubai por conta dos riscos de sanção. Com isso, o custo das vendas brasileiras fica mais alto.

Segundo ele, se aumentar o risco de novas sanções, ou elas forem aplicadas, isso vai desestimular os exportadores brasileiros pelo receio de bloqueio em pagamentos, que atrasam o recebimento das vendas àquele país.

Nos primeiros quatro meses do ano, as exportações brasileiras para o Irã cresceram 62%. O país persa se tornou o segundo maior importador de carne bovina brasileira. Apesar de ser pequena a participação (0,9%) no comércio externo brasileiro, o governo aposta no seu crescimento e na diversificação de mercados.

Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/mundo/747531-brasil-teme-que-sancoes-ameacem-comercio-bilateral-com-o-ira.shtml

terça-feira, 8 de junho de 2010

Debate na TV da Assembleia Legislativa

No último dia 28/05 a convite da TV Sinal,da Assembleia Legislativa do Paraná participei de um debate sobre o acordo Brasil-Turquia-Irã, sua repercussão e consequencias,além de uma reflexão sobre a política externa brasileira. Hoje a TV Sinal disponibilizou a íntegra dos programas em seu site. O programa Plano Geral,dividido em três blocos pode ser visto nos links abaixo:

http://www.alep.pr.gov.br/video/plano-geral-brasil-e-ira-bloco-1

http://www.alep.pr.gov.br/video/plano-geral-brasil-e-ira-bloco-2

http://www.alep.pr.gov.br/video/plano-geral-brasil-e-ira-bloco-3

terça-feira, 1 de junho de 2010

Justificando o injustificável...

Após atacar um navio que trazia ajuda humanitária a Faixa de Gaza,isolada por Israel há 2 anos,matando 10 pessoas e ferindo 30, o país judeu agora tenta justificar o injustificável: a truculência de sua ação. Nada,nada justifica que os soldados tenham aberto fogo contra os tripulantes de um navio que,como já era de conhecimento geral, era formado por parlamentares da União Europeia,membros de ONG's e até um sobrevivente do Holocausto. Mesmo que essas pessoas tenham reagido à invasão da embarcação como alega Israel,há maneiras não-letais de se controlar um grupo de pessoas.É revoltante ver pessoas dizendo que levar alimentos e remédios a uma população sitiada seja um "ato de terrorismo". Os manifestantes não ofereciam perigo algum aos soldados. Só queriam lembrar ao mundo o bloqueio que os habitantes de Gaza sofrem desde a incursão militar de 2008.Pensando bem,talvez este seja o perigo...

sexta-feira, 28 de maio de 2010

Uma vitória de Pirro?

Os 189 países signatários do Tratado de Não-Proliferação (TNP) reunidos em Nova York conseguiram chegar a um consenso na tarde desta sexta-feira e assinar uma declaração final, propondo um plano detalhado rumo ao desarmamento nuclear mundial e uma zona livre de armas nucleares no Oriente Médio.

A declaração final de 28 páginas foi aprovada por unanimidade hoje, último dia da conferência que durou um mês.O tratado passa por uma revisão a cada cinco anos e, na conferência de 2005, os países não conseguiram chegar a uma declaração final.
O documento final também determina uma nova conferência em 2012 "sobre o estabelecimento de uma zona livre de armas nucleares e todas as outras armas de destruição em massa no Oriente Médio". Essa foi uma ideia dos países árabes para pressionar Israel a renunciar a seu arsenal nuclear não declarado.
Após a aprovação do acordo, o chefe da delegação iraniana, Ali Asghar Soltanieh, se uniu aos demais nos calorosos aplausos na sede da Assembleia Geral da ONU.

Porém,os países que não são signatários do TNP (no caso do Oriente Médio, Israel) não são obrigados a acatar a declaração. Israel não assina o TNP justamente para não se comprometer com declarações desse tipo,portanto o que muda? Muda apenas o fato de que os árabes estão aprendendo maneiras mais sutis de expor suas posições,usando os caminhos diplomáticos ao invés da propaganda panfletária,que desde sempre têm alcance limitado.
A ideia do bloco árabe é que,mesmo que essa declaração não surta efeito imediato, no longo prazo o mundo perceba que Israel não é um país minúsculo cercado de inimigos hostis por todos os lados (o que é uma simplificação, já que Israel possui relações diplomáticas com Egito e Jordânia e nunca teve problemas sérios com as monarquias do Golfo),e que os palestinos têm direito a negociações justas em pé de igualdade,de preferência com um mediador neutro, para que finalmente seja solucionado o problema da ocupação que já dura 43 anos. Recentemente surgiu na Palestina um movimento de resistência pacífica (registrado no documentário "Budrus" da diretora brasileira Julia Bacha),que optou um caminho nunca antes tentado naquela região: a da não-violência. Pode ser que este movimento demore anos para dar frutos,ou mesmo que se esvazie antes disso,mas talvez as vitória da diplomacia obtida hoje e a resistência pacífica possam dar a resposta que décadas de conflitos armados não deram.

segunda-feira, 24 de maio de 2010

Brasil pode dominar o ciclo nuclear ainda em 2010

O Brasil está pronto para dominar o ciclo nuclear completo em escala industrial, segundo o coordenador do Programa de Propulsão Nuclear da Marinha, capitão de mar e guerra André Luis Ferreira Marques. A inauguração da primeira fase da Usina de Hexafluoreto de Urânio (Usexa), prevista para este ano, permitirá que o País atue em todas as etapas do beneficiamento do mineral radioativo, desde a extração até a fabricação do combustível nuclear em grande proporção. Com isso, o Brasil ficaria independente de outros países no processo de enriquecimento, garantindo suprimento para as usinas nucleares e também para o futuro submarino nuclear.

No Centro Tecnológico da Marinha, no complexo militar de Aramar, em Iperó (SP), onde fica a Usexa, o ritmo das obras é acelerado. Na mesma área estão sendo construídos os prédios do Laboratório de Geração Nucleoelétrica (Labgen), responsável pela fabricação do reator do futuro submarino nuclear. "A Usexa começará a funcionar nos próximos meses em fase de comissionamento, quando são testados o sistema e os equipamentos para demonstrar que eles operam corretamente. As temperaturas, as pressões, as vazões, se as válvulas estão funcionando e se a instrumentação está dando informação confiável. Mas não vamos botar o urânio, ainda."

Segundo o militar, o 'yellow cake' - urânio em forma de um pó amarelo - só deve começar a ser processado em 2011. A Usexa é formada por 40 quilômetros de tubos, tanques, fornos e milhares de válvulas, onde o mineral é misturado com outros produtos químicos para sair em estado gasoso, o hexafluoreto de urânio, ou UF6.

O objetivo da Usexa é produzir combustível para o submarino nuclear brasileiro, que deve entrar em operação por volta de 2020. No complexo de Aramar serão produzidas 40 toneladas de UF6 por ano. Atualmente só seis países têm condições de fazer a conversão do 'yellow cake' em gás: França, Rússia, Canadá, EUA, Brasil e Irã. O UF6 que o Brasil usa ainda é processado no Canadá.
As informações são da Agência Brasil.
Fonte: http://noticias.br.msn.com/artigo.aspx?cp-documentid=24337259

quinta-feira, 20 de maio de 2010

Ron Paul para Presidente!

Em um discurso perante a Câmara dos Deputados dos EUA, o deputado republicano (!) Ron Paul, do Texas (!!) expressou sua oposição ao Pacote de Sanções ao Irã referindo-se à legislação como " um dissimulado esforço para ir a guerra contra o Irã . "

Ron Paul traçou paralelos entre o impulso atual para isolar o Irã e os eventos que levaram à invasão liderada pelos EUA do Iraque em 2003: "Ouvindo o debate sobre a palavra sobre estas sanções me sinto como se estivéssemos em 2002 mais uma vez: as mesmas falsidades e distorções usadas para pressionar os Estados Unidos numa guerra desastrosa e desnecessária de um trilhão de dólares no Iraque estão sendo usadas outra vez para nos levar para o que provavelmente será uma guerra ainda mais desastrosa e cara no Irã. Os paralelos entre as situações são impressionantes. Quem acha que as sanções são uma maneira mais leve de punir um país está totalmente enganado: as sanções sempre levam ao passo seguinte.”

Continuando seu discurso, Paul foi crítico ao que ele descreveu como "alarmismo", as afirmações de que em um ano o Irã terá mísseis que capazes de atingir os Estados Unidos , e que o Irã será em breve capaz de detonar uma arma nuclear. No meio do seu discurso perguntou: “Onde nós já tínhamos ouvido antes tais alegações? “

O deputado também observou que o Irã, que é signatário do Tratado de Não-Proliferação Nuclear, nunca foi flagrado violando este tratado. Enquanto isso, Índia,Paquistão e Israel sequer são signatários do TNP e são considerados “amigos e lhes damos dinheiro”,tendo o Paquistão inclusive vendido tecnologia nuclear à Coreia do Norte sem qualquer punição. Além disso, observou Paul, o Irã não é capaz de enriquecer urânio até o nível necessário para fabricar armas nucleares. Finalmente, de acordo com a CIA, não há evidências de que o Irã esteja trabalhando atualmente em um programa de armas nucleares,embora segundo o deputado, eles certamente gostariam de tê-las,por que não? Estão cercados por vizinhos nucleares.

Ao finalizar seu discurso, Paul lembrou que “viramos o Iraque do avesso em busca de armas de destruição em massa,milhares de pessoas foram mortas e feridas e colocamos no poder xiitas aliados dos iranianos.”
Um dos comentários mais brilhantes do discurso do republicano é que os EUA estão colocando o Irã “no bolso dos chineses” ao interromper seu comércio com eles, o que “não faz o menor sentido”, e que a obsessão americana pelo controle dos recursos naturais remonta ao período do colonialismo.
Na internet já há um movimento pela candidatura de Ron Paul à presidência norte-americana em 2012. Estou pensando seriamente em aderir.

*Com a colaboração do professor Francisco Ferraz.

segunda-feira, 17 de maio de 2010

Cautela...

O Acordo Trilateral Brasil-Irã-Turquia foi uma vitória da diplomacia,mas que deve ser vista com as devidas reservas.Deve-se destacar que dificilmente o acordo sairia sem a participação do primeiro-ministro turco Recep Tayyip Erdogan,que deu as garantias a Teerã da devolução do urânio que deverá ser enriquecido a 20%.Tal acordo deverá esfriar por ora a implementação de sanções,se o Irã cumprir sua parte.

Os mais céticos afirmam que o Irã ganha tempo para desenvolver secretamente um programa com fins militares,porém é de se pensar se o governo de Teerã manipularia assim dois dos únicos países que apoiam abertamente seu programa nuclear,justamente Brasil e Turquia. Se as expectativas mais pessimistas se confirmarem aí sim o irã ficaria definitivamente isolado e ninguém mais o defenderia das sanções.

Trata-se de uma discussão altamente ideologizada. Aqueles que são a favor das sanções partem da premissa de que nenhum país islâmico é confiável (com a possível exceção da Turquia,país-membro da OTAN,e que tem boas relações com EUA e Israel)e que o Irã manterá seu programa nuclear de forma clandestina. É possível. Mas não há evidências concretas a favor deste argumento,a não ser aquilo que o intelectual palestino Edward Said chamava de "wishful thinking", uma belíssima expressão de dificil tradução, mas que significa tomar os próprios desejos como realidade e basear suas decisões e raciocínios nesses desejos e não nos fatos,manipulando argumentos para que aquilo que queremos ou esperamos aconteça.
Ou seja, se os falcões israelenses decidirem lançar um "ataque preventivo" ao Irã não importa o que o regime de Teerã faça todos os gestos serão publicamente interpretados como "traiçoeiros" e "mentirosos" porque a decisão já está tomada de antemão. Assim ocorreu com o Iraque. Mesmo com os relatórios não-conclusivos dos inspetores da ONU acerca das armas de destruição em massa nunca encontradas, a administração Bush já havia decidido pela invasão e já movimentava tropas no Golfo Pérsico meses antes da invasão,gastando bilhões de dólares num projeto o qual não voltariam mais atrás,independente do que acontecesse na ONU, situação bem retratada no filme "W" de Oliver Stone.

Mas há vozes dissonantes: um artigo do jornal britânico "The Guardian" elogiou o acordo, classificando-o de positivo para todos, "exceto para aqueles em Washington e Tel Aviv que procuram desculpas para isolar ou atacar o Irã".O texto afirma que o evento foi a "estreia de uma nova força no cenário mundial, o eixo Brasil e Turquia".
Os dois países estariam "emergindo como a força global pelo compromisso e o diálogo que o movimento não alinhado nunca conseguiu ser".

Na Espanha, o "El País" diz que a consequência mais imediata do acordo "não será traduzida em termos nucleares, mas políticos, com um notável respaldo para a Turquia e em especial, para Luiz Inácio Lula da Silva".

O jornal diz que o Irã também sai fortalecido politicamente, já que o poder de nações não alinhadas parece ter sido prestigiado com o acordo. Além disso a China e a Rússia, que vêm relutando em aplicar as novas sanções, poderiam se basear no acordo para declarar as conversas sobre punições encerradas.

Para o "The New York Times", o presidente dos EUA, Barack Obama, tem agora em suas mãos uma decisão importante: se ele ignorar o acordo, pode emitir sinais de que está rejeitando termos muito parecidos aos que se dispôs a aceitar há oito meses, quando o Irã rejeitou a proposta francesa na última hora.

Por outro lado, se aceitar, muitos dos assuntos urgentes que deveriam ser discutidos com o Irã nos próximos meses (a maioria relacionados às suspeitas de produção da bomba atômica) terão que ser colocados de lado por pelo menos um ano ou mais.

Os 10 pontos do acordo Brasil-Irã-Turquia

Veja os dez pontos da declaração, segundo publicado pela agência de notícias iraniana Irna:

1- Nós reafirmamos nosso compromisso relativo ao Tratado de Não Proliferação (TNP) e, em acordo com os artigos relacionados do TNP, lembramos o direito de todos os Estados membros, principalmente a República Islâmica do Irã, de desenvolver pesquisa, produzir e utilizar energia nuclear (assim como um ciclo de combustível nuclear que inclua atividades de enriquecimento) para propósitos pacíficos.

2- Nós expressamos nossa forte convicção de que agora temos a oportunidade de começar um processo que criará uma atmosfera positiva, construtiva, de não confronto, que leve a uma era de interação e cooperação.

3 - Nós acreditamos que a troca de combustível nuclear é instrumental para iniciar a cooperação em diferentes áreas, especialmente no que diz respeito a uma cooperação nuclear pacífica, incluindo a construção de reatores de pesquisas e usinas nucleares.

4 - Baseado neste ponto, a troca de combustível nuclear é um ponto de partida para começar a cooperação e uma medida construtiva e positiva entre as nações. Tal passo deve acabar em uma cooperação e interação positivas no campo de atividades nucleares pacíficas e em evitar todos os tipos de confrontos abstendo-se de medidas, ações e declarações retóricas que possam prejudicar os direitos do Irã e obrigações decorrentes do TNP.

5 - Baseado nos itens acima, para facilitar a cooperação nuclear mencionada anteriormente, a República Islâmica do Irã aceita enviar um estoque de 1.200 kg de urânio levemente enriquecido à Turquia. Enquanto estiver na Turquia, este urânio permanecerá como propriedade do Irã. O Irã e a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) poderão acionar observadores para monitorar as condições de segurança deste estoque.

6 - O Irã informará a AIEA por escrito, por canais oficiais, a respeito deste acordo em sete dias após a data desta declaração. Após uma resposta positiva do grupo de Viena (Estados Unidos, Rússia, França, AIEA), os detalhes da troca de combustível serão objeto de um acordo escrito e arranjos apropriados entre o Irã e o grupo de Viena, comprometido especificamente a fornecer os 120 quilos do combustível necessários para o reator de pesquisas de Teerã (TRR).

7 - Quando o grupo de Viena declarar seu comprometimento com as condições e pontos desta declaração, ambas as partes se comprometerão com a implementação do acordo mencionado. O Irã expressou estar preparado, em acordo com a declaração, para enviar seu urânio pouco enriquecido em um mês.

8 - Se as condições desta declaração não forem respeitadas, a Turquia, a pedido do Irã, se compromete a devolver sem condições e rapidamente o urânio levemente enriquecido ao Irã.

9 - A Turquia e o Brasil recebem favoravelmente a disposição da República Islâmica do Irã em manter as negociações com os países do grupo 5+1 (Estados Unidos, Rússia, China, França, Reino Unido e Alemanha) em qualquer lugar, incluindo Turquia e Brasil, a propósito das preocupações comuns.

10 - Turquia e o Brasil apreciam o compromisso do Irã com o TNP e seu papel construtivo em buscar a concretização dos direitos nucleares de seus Estados membros. A Republica Islâmica do Irã, por sua vez, aprecia os esforços construtivos dos países amigos, Turquia e Brasil, em criar um ambiente condutor para a realização dos direitos nucleares do Irã.

Com France Presse
Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/folha/mundo/ult94u736306.shtml

sexta-feira, 14 de maio de 2010

O Óbvio Ululante

Finalmente a tão aguardada visita do presidente Lula ao Irã se aproxima. Em entrevista recente Lula afirmou que vai fazer o que Obama,Gordon Brown e outros não fizeram: falar cara a cara com Ahmadinejad. É óbvio que Lula não está indo para o Irã somente para isso,pois esta visita já estava agendada desde visita de Ahmadinejad no segundo semestre do ano passado e o Brasil tem assuntos comerciais a discutir. Mas apesar do ceticismo geral o fato é que o presidente brasileiro conseguiu com que as atenções do mundo estejam voltadas para um encontro entre dois líderes de países tradicionalmente considerados periféricos. Hoje na Rússia Lula disse que considera que sua intenção de convencer o líder iraniano a fazer um acordo com o Ocidente para evitar sanções tem 99% de chances de ser bem-sucedido. Medvedev o líder russo disse que "sendo otimista", Lula teria 30%.
Analistas conservadores,especialmente no Brasil, têm expressado sua preocupação com a possibilidade de que o Brasil seja visto como um "rogue state" se ficar do lado de Teerã até que se comprove que realmente o programa nuclear iraniano possui fins bélicos. Dizem que o Brasil têm sido ingênuo e que está pondo a perder a sua credibilidade internacional por algo que não lhe diz respeito.
Não? Curiosamente o que pouco tem se falado nas análises é que Lula não está defendendo o diálogo com o Irã por simples capricho,para ir contra a maré ou simplesmente para ficar sob os holofotes,embora isso esteja de fato acontecendo. O Brasil apoia o programa nuclear iraniano porque deseja desenvolver o seu próprio programa,como foi dito no primeiro post deste blog.
A grande diferença é que a alguns anos atrás a voz de um presidente brasileiro não seria ouvida e hoje o Brasil além de ser o sexto maior produtor mundial de urânio possui um capital diplomático que permite a ele expor suas posições e ser ouvido num mundo cada vez mais multilateral,onde o chamado Bric (Brasil,Rússia,India e China) formam um grupo impossível de ser ignorado.

terça-feira, 4 de maio de 2010

Pode o Brasil Salvar o Mundo de uma Guerra contra o Irã?

Esta é uma adaptação da apresentação a 03 de maio do workshop Assuntos Globais do curso de Relações Internacionais da Escola Superior de Propaganda e Marketing em São Paulo. Nela o professor Robert Naiman coordenador da Just Foreign Policy, uma organização dedicada a mobilizar norte-americanos interessados em uma política externa de seu país baseada no Direito Internacional e na diplomacia, fala sobre a crescente importância do Brasil na questão nuclear iraniana:



"Nas últimas décadas, questões fundamentais internacionais de guerra e paz têm sido em grande parte determinado por um pequeno grupo de países, especialmente os membros permanentes do Conselho de Segurança das Nações Unidas, os EUA., Grã-Bretanha, França, Rússia e China, com a contribuição do chamado G7 democracias industriais: Alemanha, Itália, Canadá e Japão. Os cinco membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU cada um tem direito de veto sobre as resoluções do Conselho de Segurança da ONU, eles também são os únicos países reconhecidos como Estados dotados de armas nucleares sob o Tratado de Não-Proliferação Nuclear.

Estamos agora em um novo momento nas relações internacionais, em que os países fora dos membros permanentes do Conselho de Segurança e seus aliados estão insistindo em fazer alguma contribuição significativa para estas questões, e estão começando a ter algum sucesso em seu processo de inclusão. O Brasil tem sido um líder nesses esforços.

O exemplo mais marcante desta mudança é a disponibilidade recente do Brasil e da Turquia para desafiar a liderança dos Estados Unidos sobre a questão do programa nuclear iraniano.

Os governos dos Estados Unidos, Grã-Bretanha e França tentam aprovar novas sanções econômicas impostas contra o Irã no Conselho de Segurança das Nações Unidas, como punição para a recusa do Irã em suspender o enriquecimento de urânio. Teerã diz que precisa de urânio enriquecido para abastecer o seu programa civil de energia nuclear e seu reator de uso hospitalar médica mas os EUA acusam o Irã de tentar adquirir uma arma nuclear. Até agora, tanto quanto se sabe, o Irã tem produzido apenas urânio pouco enriquecido, o que não pode ser usado para produzir uma arma nuclear. No entanto, um estoque de urânio pouco enriquecido pode ser enriquecido para armas nucleares embora isso não seja tão simples quanto muitos leigos pensam.

O enriquecimento de urânio pelo Irã ou outras armas não-nucleares estados não é uma violação do Tratado de Não-Proliferação Nuclear, e é geralmente reconhecido que o TNP dá o direito do Irã de enriquecer urânio,assim como Alemanha, Japão, Argentina, Brasil e Países Baixos enriquecem urânio sem violar o Tratado de Não-Proliferação Nuclear (TNP) a o artigo 4 do Tratado deixa bem claro que este direito se estende a todos sem exceção. Inclusive o Irã.

Mas a posição dos EUA e seus aliados mais próximos tem sido a de que o Irã deve ser obrigado a perder o seu direito de enriquecer urânio, mesmo para um programa puramente pacífico , uma vez que o conhecimento tecnológico que o Irã está adquirindo através do enriquecimento de urânio poderia ser desviada para um programa militar, no futuro. Em suma: os EUA e seus aliados simplesmente não confiam no Irã.

Embora seja verdade que o Irã não tenha sido completamente transparente sobre suas atividades, motivações e intenções, há uma diferença significativa de opinião entre os países e mesmo dentro dos Estados Unidos sobre o que isso implica e que deve ser feito sobre isso.

Na verdade, há um crescente corpo de opinião entre os analistas ocidentais que o objetivo do Irã não é a aquisição de uma arma nuclear, mas a aquisição de conhecimentos tecnológicos para montar os componentes de uma arma nuclear sem violar o TNP. Assim o Irã poderia colocar-se em uma posição onde ele pode rapidamente adquirir uma arma nuclear se for atacado.Este procedimento pode dar ao Irã o benefício de adquirir uma arma nuclear como um impedimento contra um ataque ocidental, sem que o Irã viole abertamente o Tratado.

O objetivo EUA, portanto, não tem sido apenas para impedir o Irã de adquirir uma arma nuclear : a meta é impedir o Irã de adquirir os benefícios de dissuasão que o protejam de um ataque norte-americano ou israelense. Os Estados Unidos tem se engajado em uma luta de influência com o Irã na região, sobretudo no Iraque, mas também no Líbano, entre os palestinos, no Afeganistão e dos países predominantemente sunitas do Golfo Pérsico. Acredita-se amplamente em Washington, que os vizinhos do Irã o consideram imune à ameaça de um ataque militar e , isso poderia aumentar drasticamente a influência do Irã na região em detrimento de Estados Unidos.

Esta crença de que permitir que o Irã use seu programa nuclear como um impedimento contra o ataque aumentaria a influência do Irã na região criou um quase-consenso de Washington de que os EUA não podem se contentar em apenas impedir o Irã de adquirir uma arma nuclear, os EUA devem impedir o Irã de se sentir seguro.

Funcionários do governo norte-americano afirmaram que um ataque militar ao Irão iria no máximo, atrasar a capacidade do Irã de adquirir uma arma nuclear em alguns anos. Além disso, uma ação preventiva contra o Irã seria uma violação grave do direito internacional, que poderia causar graves danos políticos para os Estados Unidos, como a invasão do Iraque em 2003, desafiando a ONU. E um ataque militar norte-americano poderia ter consequências extremamente negativas para os EUA em termos de retaliação iraniana na região, no momento em que os EUA tem 150 mil soldados no Afeganistão e no Iraque.

Assim, os Estados Unidos procuraram conter o programa nuclear do Irã com novas sanções da ONU.

Mas, para obter novas sanções do Conselho de Segurança contra o Irã, é claro que os EUA precisam da cooperação de outros. É necessária a cooperação da Rússia e da China, em parte porque a Rússia e China são membros permanentes do Conselho de Segurança e, portanto, poderiam, em teoria vetar qualquer resolução mas principalmente porque ambos têm fortes laços econômicos com o Irã, e seu setor de energia, em particular.

Mas os EUA também precisam do apoio de países fora dos cinco membros permanentes. De acordo com o procedimento da ONU, para conseguir uma resolução novas sanções na ONU, os EUA não precisam apenas evitar o veto dos cinco membros permanentes, é necessário também o apoio favorável de nove membros dos 15 membros do Conselho de Segurança. Tal como está agora, pelo menos, Brasil, Turquia e Líbano, atualmente membros rotativos do conselho provavelmente irão voltar pelo “Não” ou abster-se. Pode haver outros dissidentes, e como um objetivo-chave dos norte-americanos é demonstrar que o Irã está isolado aprovar uma sanção por 9 votos a 6 por exemplo solaparia tal efeito.

Até recentemente, a maior parte da atenção tem sido sobre se os EUA podem induzir a Rússia e a China a aprovar novas sanções. Mas agora o Brasil, juntamente com a Turquia, está pressionando fortemente por uma resolução diplomática para a crise, ao invés de novas sanções, e os relatórios de imprensa recentes têm sugerido que a recente iniciativa diplomática do Brasil teve pelo menos o efeito de atrasar a votação da ONU, enquanto o Brasil e Turquia, atuando como mediadores, tentam trazer de volta à tona uma proposta ocorrida ano passado em que o Irã enviaria alguns de seu estoque de urânio pouco enriquecido para fora do país em troca de receber urânio de alto enriquecimento para o reator de pesquisas médicas, que produz isótopos médicos para o tratamento de câncer.

A proposta para a troca de combustível, que inicialmente foi fortemente apoiada pelo os EUA obrigaria o Irã a suspender o enriquecimento de urânio.

Para os iranianos a proposta para a troca de combustível é muito mais palatável do que suspender o enriquecimento. No Irã, a exigência de suspender o enriquecimento é visto como equivalente a uma demanda que o país desista completamente de seu programa nuclear ,o que é visto como algo que fere a soberania da nação.

O governo brasileiro comparou a pressão atual para que sanções sejam aplicadas contra o Irã com o que ocorreu na preparação para a invasão do Iraque em 2003. Em particular, o Brasil tem expressado o temor de que novas sanções agora prejudiquem as perspectivas de uma solução diplomática e, portanto, definam o cenário para uma nova guerra.

Se o Brasil, trabalhando em conjunto com a Turquia e outros países, conseguir intermediar um acordo entre os EUA e o Irã sobre o programa nuclear iraniano, evitando uma nova guerra que poderia salvar a vida de muitos milhares de pessoas. E, além disso, o custo da guerra não é simplesmente mensurável em vidas perdidas e no dinheiro gasto diretamente no conflito armado. Também há os custos de distrair o mundo de outros assuntos. Afinal,quando o mundo está falando sobre o programa nuclear do Irã, ele não está falando sobre como responder à ameaça do caos climático, ou alcançar as metas da ONU para redução da pobreza, ou garantir o direito dos palestinos à autodeterminação nacional.

O esforço do Brasil para impedir a guerra entre o Ocidente e o Irã e garantir um acordo diplomático deve ser elogiado: na verdade, é o tipo de esforço para que o Prêmio Nobel da Paz foi atribuído no passado. Em 1906, o Presidente dos EUA Theodore Roosevelt foi premiado com o Nobel da Paz para a intermediação do Tratado de Portsmouth, que terminou com a guerra russo-japonesa poupando cerca de duzentos e cinqüenta mil vidas,segundo estimativas.

Agora o Brasil está em plena campanha de eleição presidencial, e alguns da oposição, oportunista,s atacam a política externa do Brasil chamando-a de "ideológica". Mas este é um chamado a um "pragmatismo" na qual o Brasil aceitaria tudo o que Washington faz. O mundo não pode pagar mais este tipo de "pragmatismo", que conduziria provavelmente a mais banhos de sangue iniciados por Washington como o que ocorreu no Iraque. Nos próximos meses, espero que a maioria dos brasileiros não veja estas iniciativas como a política externa do governo Lula, mas como a política externa do Brasil, assim, que não importa quem vença a eleição, o Brasil ainda será um líder mundial para a paz."

quarta-feira, 28 de abril de 2010

"Muito mais ingênuos são os que acreditam em tudo o que o serviço de inteligência americano fala."

Numa brilhante entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo do dia 25,o chanceler Celso Amorim,que como o próprio jornal lembra,logo será o mais longevo entre os nossos ministros das relações exteriores superando até o lendário Barão do Rio Branco,patrono da nossa diplomacia,mais uma vez deixou claras as premissas básicas da nossa diplomacia: a autonomia,a independência e o pragmatismo,tendência que o Brasil já segue há décadas,com um breve intervalo nos mandatos de Collor e FHC.
O entrevistador tentou colocar Amorim contra a parede em praticamente todas as perguntas,com temas como Cuba,Honduras e,obviamente,a bola da vez, o Irã. Nos ateremos aqui a este último tema.
Em tom sóbrio,como cabe a qualquer diplomata que se preze,o chanceler brasileiro se atém aos fatos: não há previsões de que o Irã obtenha a bomba pelo menos nos próximos três anos (informação reconhecida até mesmo por autoridades como Thomas Pickering, que trabalhou com a ex-secretária de Estado dos EUA Madeleine Albright, ou o ex-conselheiro de Segurança Nacional dos EUA, Zbigniew Brzezinski).
A posição do Brasil é de sobriedade: o Irã deveria ter aceito a proposta de trocar o seu urânio enriquecido a 20% por elementos combustíveis para o reator de Teerã, já que o governo iraniano alega que o principal motivo do seu programa nuclear é o uso hospitalar desse tipo de energia. Mas não é porque Ahamdinejad recusou tal troca (segundo Teerã porque a mesma não seria instantânea,ou seja,o Irã teria que entregar seu urãnio primeiro e esperar até Allah sabe quando para que a troca fosse efetuada),que devemos voltar ao discurso republicano de "todas as opções estão sobre a mesa", uma maneira velada de dizer "façam o que queremos ou terão o mesmo destino do Iraque."
Para o presidente Lula, o governo do presidente do Irã, Mahmoud Ahmadinejad, tem os mesmos direitos dados ao governo brasileiro. Em busca de uma solução pacífica que impeça eventuais sanções por parte do Conselho de Segurança das Nações Unidas, Lula enviou Celso Amorim, para Teerã (Irã), Istambul (Turquia) e Moscou (Rússia).
Segundo Lula, é obrigação de todos buscar um acordo de paz e preservar o direito de cada país de ter seu programa de desenvolvimento de energia nuclear por representar o caminho para a preservação do meio ambiente e também para vários projetos pacíficos. “O risco maior que eu poderia ter era me omitir achando que só alguns países podem cuidar da paz”, disse ele.Um recado claro a Washington dado também por Amorim que em dado momento da entrevista ao Estadão questiona porque é tão importante para um certo grupo da elite brasileira saber o que os outros pensam...

Para ler a entrevista completa: http://www.estadao.com.br/estadaodehoje/20100425/not_imp542722,0.php

terça-feira, 20 de abril de 2010

Brasil é 'jogador intrigante' na diplomacia global, diz revista britânica

A revista Monocle, editada na Grã-Bretanha, traz na edição deste mês uma reportagem sobre os motivos do que chama de boom diplomático brasileiro, afirmando que o Brasil é “um jogador intrigante” na diplomacia global.

“Está claro que o Brasil se tornou um jogador intrigante no cenário diplomático mundial, flexionando seus joviais músculos e usando seus cotovelos para gentilmente cutucar as antigas potências, especialmente os Estados Unidos, para que saiam de seu caminho quando necessário”, diz o artigo "Um Ministério de Sol - Brasília", assinado pelo jornalista Andrew Tuck.

A revista diz que analistas ocidentais e brasileiros de classe média acham que o Brasil está se aproximando demais de países como o Irã, a Venezuela e a China, e ignorando tradicionais parceiros comerciais como os Estados Unidos e Israel.

Do outro lado, diz o artigo, há os que acreditam que o país está simplesmente buscando o respeito que “essa nação próspera e rica em recursos merece” e que a promoção de novas alianças é um “inovador contrapeso ao poder norte-americano”.

“O que todos têm certeza é que o Brasil quer ser ouvido e que a principal ambição do país é conquistar uma vaga permanente no Conselho de Segurança da ONU”, afirma.

Desafios
Essa ambição, no entanto, deverá esbarrar em desafios no futuro, segundo analistas ouvidos pela reportagem.
Entre eles estariam as incertezas sobre os rumos da política externa brasileira quando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva deixar o poder, a suspeita de que o Itamaraty só pode ser audacioso “enquanto a economia estiver forte” e a resistência de alguns países latino-americanos à expansão da influência do Brasil.

“Eles (alguns países latino-americanos) estão temerosos de que os Estados Unidos possam se retirar e deixar o Brasil liderar toda a política externa”, afirma Michael Shifter, presidente do Programa Andino no Diálogo Interamericano, uma organização com sede em Washington.

“Eles querem multiplicar suas opções, não querem ser submetidos aos desejos do Brasil”, diz.
A revista também fala sobre a influência cultural brasileira. “Diferente dos debates econômicos, envolver o público com a cultura brasileira não é tarefa difícil – da música ao futebol, o mundo está aberto ao poder suave do Brasil.”

“Colocando simplesmente, o mundo gosta dos brasileiros e do que eles representam.”
Estilo brasileiro
Segundo a Monocle, o estilo informal do presidente brasileiro pode ser visto como um trunfo. A revista cita, como exemplo, o fato de Lula ter substituído os tradicionais jantares de Estado por almoços no esquema self-service, um esquema que teria sido aceito sem problemas pelos chefes de Estado.

“É uma metáfora adequada para a nova diplomacia do governo: talvez problemática para os tradicionalistas, estranhamente inovadora para outros, certamente quebrando algumas regras”, diz.

“Mas tudo feito com um estilo brasileiro que, no final das contas, deveria deixar poucas pessoas se sentindo ameaçadas.”

Fonte: http://noticias.uol.com.br/bbc/2010/04/19/brasil-e-jogador-intrigante-na-diplomacia-global-diz-revista-britanica.jhtm

domingo, 18 de abril de 2010

Pressões sobre o Brasil

Os EUA esperam a adesão do Brasil ao protocolo adicional que permitiria inspeções da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) até a reunião de revisão do Tratado de Não-Proliferação Nuclear, que se realiza em maio, em Nova York.

O Brasil é um dos poucos países que não assinou o protocolo. A posição de Brasília é rejeitar novos compromissos no âmbito do TNP até que os países com armas nucleares cumpram sua promessa de desarmamento.
Uma das funções da AIEA é garantir que os materiais e as atividades nucleares de um país sejam utilizados exclusivamente para fins pacíficos. Para isso a Agência assina com os países (ou conjunto de países) um acordo de Salvaguardas Nucleares.
Os países que assinam tais acordos são, de maneira geral, signatários de um outro acordo em que renunciam ao uso e posse de armas nucleares.

Na grande maioria dos países, este acordo é o TNP. O Brasil sempre considerou esse acordo discriminatório e preferiu, juntamente com a Argentina, assinar um acordo bilateral onde basicamente os mesmos compromissos eram assumidos.

Com base nesse acordo Brasil, Argentina, ABACC (Agência Brasileiro-Argentina de Contabilidade e Controle de Materiais Nucleares) e AIEA assinaram em Dezembro de 1991, um acordo de Salvaguardas denominado Quadripartite. Esse mesmo acordo de salvaguardas foi usado para atender ao TNP quando Argentina e posteriormente o Brasil resolveram ratificá-lo.

Porém,quando foram descobertos os programas clandestinos do Iraque e da Coréia do Norte, não obstante serem esses países signatários do TNP e ter em vigor um Acordo de Salvaguardas com AIEA o sistema de salvaguardas existente foi contestado.

Sob liderança dos EUA a Assembléia da AIEA resolveu adotar medidas que foram chamadas de “fortalecimento de salvaguardas”. Algumas medidas puderam ser adotadas de imediato porque se entendeu que a AIEA já tinha mandato para tanto, outras ficaram pendendo da aceitação pelos países de um Protocolo Adicional cujo modelo foi aprovado pela AIEA em 1997.

A diferença entre o novo tipo de “salvaguardas fortalecidas” e o precedente pode-se resumir no seguinte: anteriormente, os países declaravam seus materiais (essencialmente, Urânio a partir de uma certa pureza e Plutônio) e suas instalações nucleares e a AIEA (e a ABACC) se encarregavam da contabilidade do material declarado nas instalações declaradas. Essas instituições cuidavam para que não houvesse desvios nessa contabilidade. Todavia, a eventual existência de um "caixa dois" de materiais e instalações independentes era praticamente ignorada. As novas salvaguardas ocupam-se também da possibilidade de existência desse “caixa dois”.

O Brasil já aceitou a necessidade da AIEA certificar-se de que a declaração dos países sobre atividades e materiais nucleares seja completa. Neste sentido, algumas medidas do chamado “fortalecimento de salvaguardas” já estão em vigor.

O Protocolo Adicional objetiva ampliar as informações recebidas dos países e dar à AIEA um maior acesso a instalações declaradas ou não. Com ele, em teoria, qualquer lugar do País poderia estar sujeito a inspeções. Alguns lugares poderiam, no entanto, merecer um acesso administrado que visa preservar alguns segredos tecnológicos.

Um dos pontos mais polêmicos do novo tipo de salvaguardas é que a AIEA deve ser capaz de fornecer anualmente uma certificação confiável não somente sobre o material nuclear declarado em um país mas sobre a ausência de materiais e instalações nucleares não declarados.

Anteriormente já existia considerável dúvida sobre a possibilidade de um país poder conseguir esse tipo de “atestado negativa”. Com o episódio sobre a comprovação da não existência de armas de destruição em massa no Iraque essa dúvida ficou fortalecida. Também ficou evidente o risco que pode correr o país que aceite um compromisso que implique em constantemente ter que provar sua inocência.

No governo FHC,o Brasil aceitou ratificar o Tratado de Não Proliferação Nuclear. O TNP é assimétrico e discriminatório, por dispensar a inspeção em países nuclearmente armados e inspecionar somente os desarmados. Até a assinatura do TNP, o nosso compromisso era com a Argentina,e com as já citadas ABAA e AIEA e não diretamente com a ONU, como passou a ser.

Esperamos que o Brasil não assine este protocolo adicional que fere a nossa soberania e acima de tudo é de uma hipocrisia ímpar,reforçada pelo acordo assinado recentemente em que Rússia e EUA se compromente em descartar armas ultrapassadas,gesto inócuo,visto pelos menos informados e mais ingênuos como um "grande passo rumo ao total desarmamento nuclear".

O governo brasileiro não pode ceder em troca de promessas vãs de um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU,e nem à ameaças veladas de que, em caso de negativa o Brasil estaria muito próximo de ser tratado com um "rogue state". O nosso contexto e posição geográfica são completamente distintos de Coreia do Norte e Irã,e o Brasil possui uma longa tradição diplomática de país pacífico e cumpridor dos tratados dos quais é signatário e não precisa de forma alguam se submeter à inspeções intrusivas.

terça-feira, 13 de abril de 2010

Cartas Marcadas em Washington

Quarenta e sete nações foram convidadas pelo governo norte-americano para a Conferência sobre Segurança Nuclear. Entre elas oito dos nove países detentores da bomba nuclear (EUA, Rússia, China, França, Reino Unido, Índia, Paquistão e Israel). Curiosamente, Coréia do Norte e Irã que serão temas centrais das discussões não foram convidados. O embaixador iraniano nas Nações Unidas Ali Soltanieh afirmou que a cúpula nasce com seu resultado predeterminado já que apenas nações selecionadas pelos EUA foram convidadas. Além disso a nova política norte-americana para o uso de armas nucleares,causou revolta no Irã. No documento, os EUA deixam em aberto a possibilidade de uso de armas nucleares contra países "fora da lei" como o Irã e a Coreia do Norte. Tal atitude causou protestos oficiais do governo iraniano junto à ONU que chamou a estratégia de "terrorismo de Estado".
Enquanto isso o Irã promove sua própria Conferência de Desarmamento Nuclear em Teerã nos próximos dias 17 e 18 de abril com a presença de membros da ONU e da Agência Internacional de Energia Atômica.

sábado, 10 de abril de 2010

Irã não vai implorar para evitar sanções, diz Ahmadinejad

Por Hashem Kalantari TEERÃ (Reuters) - O presidente do Irã declarou na quinta-feira que não vai implorar aos adversários do programa nuclear de Teerã para evitar sanções, enquanto Rússia e Estados Unidos diziam que novas medidas podem se fazer necessárias.
Mahmoud Ahmadinejad, que na quarta-feira chamou o presidente americano Barack Obama de "caubói" dotado de armas nucleares, disse que o Irã "vai tentar converter as sanções em uma oportunidade", e não mudar sua postura para tentar evitar que elas sejam impostas.

"Não saudamos a ideia de ameaças ou sanções, mas jamais imploraríamos àqueles que nos ameaçam com sanções para que revertessem suas sanções contra nós", ele teria dito, segundo a agência oficial de notícias IRNA.

Ahmadinejad falou no momento em que Obama e o presidente russo Dmitry Medvedev assinavam um tratado de redução de armas nucleares em Praga. Obama disse que ele e Medvedev estão "trabalhando juntos no Conselho de Segurança das Nações Unidas para aprovar sanções contundentes contra o Irã".

Medvedev disse que está insatisfeito com a postura do Irã em relação a seu programa nuclear, que o Ocidente acredita que tenha por objetivo o desenvolvimento de armas atômicas.

"Teerã não está reagindo a uma série de acordos construtivos sugeridos para se chegar a uma solução de compromisso. Não podemos fechar nossos olhos para esse fato. É por isso que não excluo a possibilidade de o Conselho de Segurança ter que estudar esta questão novamente", disse Medvedev a jornalistas.

Obama espera persuadir a Rússia e a China, ambas com poder de veto no Conselho de Segurança, a abrir mão de sua tradicional relutância em relação à adoção de novas sanções.

Sua campanha deverá continuar na próxima semana, quando Medvedev e o presidente chinês Hu Jintao comparecerão a uma cúpula em Washington sobre a segurança nuclear.

Ao mesmo tempo em que fez pouco caso da ameaça de sanções, o Irã lançou um aviso desaconselhando que sejam tomadas medidas militares contra seu programa nuclear.

Depois de vários avisos de que vai reagir contra Israel se esse país o atacar, o chefe militar iraniano disse na quinta-feira que, se o Irã for atacado por Washington, ele atacará forças americanas estacionadas no Oriente Médio.

"Se a América lançar uma ameaça séria ao Irã e tomar qualquer medida contra o Irã, nenhum dos soldados americanos que se encontram na região voltará vivo para os Estados Unidos", teria dito o general Hassan Firouzabadi, segundo a agência de notícias semioficial Fars.

Tropas americanas estão em ação militar no Iraque e Afeganistão. Os dois países fazem fronteira com o Irã.

(Reportagem adicional de Denis Dyomkin, em Praga)

Agradeço a colaboração de Luciana Garcia!

sexta-feira, 9 de abril de 2010

Amorim acredita em acordo com Irã e desaconselha sanções da ONU

O ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, afirmou ontem que ainda é possível um acordo entre a Agência Internacional de Energia Atômica (Aiea) e o governo do Irã sobre o programa nuclear daquele país. Isso poderia evitar a imposição de novas e mais severas sanções econômicas, desta vez com apoio da Organização das Nações Unidas.

- Se as sanções se confirmarem, o presidente Mahmoud Ahmadinejad ficará isolado e haverá uma radicalização, inclusive com o apoio da oposição no país - advertiu Amorim durante em audiência pública na Comissão de Relações Exteriores e defesa Nacional (CRE).

O chanceler brasileiro disse ter "quase certeza" que o Irã não renunciará ao seu programa de enriquecimento de urânio, que Amorim classificou como "para fins pacíficos".

- É um país que tem enormes reservas de urânio. Além disso, não é proibido enriquecer urânio - observou o ministro.

Amorim disse aos senadores que, sem acordo e com radicalização, teme que ocorra com o Irã o mesmo que se deu com o Iraque sob Saddan Husseim, país no qual a população pobre é que pagou o preço das sanções econômicas. O chanceler, entretanto, ponderou que o Irã "precisa cooperar o máximo possível".
"Enquanto houver um país com armamento nuclear, outro também vai querer se armar" afirmou.

O grande embate da audiência deu-se entre o ministro e o líder do PSDB no Senado, Arthur Virgílio (AM), que vem mantendo uma queda de braço com o governo, e já anunciou que vai obstruir votações com a indicação de novos embaixadores, em protesto contra a política externa. Neste momento, estão parados na CRE os exames dos nomes de uma dezena de diplomatas indicados pelo presidente da República para representações no exterior.

O parlamentar amazonense sustentou ser "uma ingenuidade achar que o Irã não quer produzir uma bomba atômica".

Me pergunto quais as informações privilegiadas que Arthur Virgílio pode ter para afirmar com tanta certeza que o Irã quer a bomba e não ser o preconceito e o "achismo" que como corretamente tem avaliado o governo brasileiro marcaram o pré-guerra com o Iraque. Muitos acreditaram que Saddam possuía armas de destruição em massa apenas baseados na ideia de que Saddam era "do mal" e obviamente teria essas armas. Por este "raciocínio" Teerã quer ter armas atômicas porque é um "regime fanático" que quer "varrer Israel do mapa". A verdade é muito mais complexa que isso: se Teerã realmente estiver desenvolvendo armas atômicas isso se deve mais a uma vontade de equilibrar o poder militar com Israel do que atacá-lo,até porque um bombardeio nuclear iraniano fatalmente atingiria também a população palestina e seus aliados do Hamas financiados por Teerã. O maior perigo à segurança mundial seria aum ataque "preventivo" de Israel ao Irã que poderia desencadear uma resposta imprevisível do regime de Teerã e de seus aliados no Líbano,Síria, Gaza e Cisjordânia.

segunda-feira, 5 de abril de 2010

Relações do Brasil com o Mundo Árabe-parte II

O mundo árabe ocupa um território de 12.911,94 milhões de quilômetros quadrados, e cerca de trezentos milhões de habitantes estendendo-se por 85% da faixa entre o Mediterrâneo, Golfo Pérsico, Mar Vermelho e Mar da Arábia (os outros 15% são ocupados por Irã e Israel). Divide-se em duas sub-áreas: a primeira, chamada Maghreb (Ocidente), compreende o norte da África, ou seja: Marrocos, Tunísia, Líbia e Argélia. A segunda, denominada Macharek, (Oriente), inclui Egito, Kuwait, Iraque, Jordânia, Líbano, Síria, Iêmen, Emirados Árabes Unidos, Sudão e Arábia Saudita.
Após o estabelecimento de relações diplomáticas com o Egito, os próximos países com quem o Brasil estreitou os laços foram Líbano (1946), e Síria (1952). Estas eram justificadas pela grande colônia sírio-libanesa presente no país, a qual tinha estabelecido canais de comércio e exportação com seus países de origem, através de contatos de parentesco e amizade. Para se ter uma idéia, em 1968, cerca de 60% das exportações brasileiras ao mundo árabe eram dirigidas ao Líbano.

Em 1961, o Brasil estabelece relações com Marrocos, Tunísia e Argélia. Esta decisão foi muito criticada na época, devido à sua falta de sentido prático. E realmente, após seis anos, não havia sido constatada nenhuma relação comercial entre o Brasil e estes países norte africanos. O Brasil importava relativamente muito (5% de suas importações, basicamente fosfato, petróleo e potassa), e exportava pouco, criando assim um déficit em sua balança comercial.
Dentro da ótica comercial brasileira, no entanto, o Iraque era considerado comercialmente mais interessante do que o grupo formado por Síria, Líbano e países do Maghreb. A Arábia Saudita também foi encarada como parceira em potencial, tendo o Brasil iniciado contatos preliminares com os sauditas em 1967.
As primeiras tentativas de ingresso do Brasil nos mercados árabes não foram bem-sucedidas, devido ao desconhecimento mútuo entre economias e culturas tão distintas . Ambos os lados demonstravam interesse em incrementar o comércio, mas a conexão entre os setores técnicos e produtivos não era eficiente. Porém,na década de 1970havia três boas razões para o Brasil querer ingressar no mercado árabe:
a) Ter acesso a um mercado maior que o brasileiro tanto em população quanto em poder aquisitivo.
b) Por ser um mercado supridor dos minerais que o Brasil precisava como petróleo, potassa e fosfato a preços que eram de três a cinco vezes inferiores ao mercado interno brasileiro.
c) Acesso direto ao mercado de capitais dos países produtores de petróleo.

Obviamente que antes da década de 1970,já era importante preencher este último quesito.No entanto,a crise do petróleo o transformou numa necessidade.Foi proposto um programa para criar incentivos que rompessem aquele imobilismo: a criação de transações diretas tanto de venda quanto de compra, evitando intermediários e com a finalidade de estimular a criação de escritórios brasileiros naqueles países, assim como a criação de firmas locais brasileiras; o estabelecimento de empresas brasileiras em zonas francas árabes, como: Tanger, Bizerta, Port Said e Beirute, e a criação de linhas de crédito para importação e exportação. No entanto, já era consenso a idéia de que o conhecimento mútuo por meio da diplomacia era a melhor tática. A princípio, o Brasil estabeleceu representação em Tunis, que respondia também pelo Marrocos, Argélia, Líbia e obviamente a própria Tunísia; Cairo que alcançava Egito, Sudão, Kuwait e Iêmen; Beirute que abrangia Líbano, Chipre, Jordânia, Síria, Arábia Saudita e Iraque; e Karachí, que abrangia os Emirados Árabes Unidos, Catar, Bahrein, Omã e Paquistão. Na época foram propostos também cursos de comércio exterior a serem ministrados no Itamaraty voltados para o mercado árabe, similares a outros já existentes nos EUA e Europa.

Em 1968, o Brasil deu início às relações diplomáticas com a Arábia Saudita, ficando a embaixada brasileira no Líbano encarregada de responder pelas ligações com Riad. Em contrapartida, as relações diplomáticas sauditas com o Brasil e América Latina eram administradas desde sua embaixada em Washington (EUA). No entanto, em 1973, foi decidido que os dois países trocariam embaixadores, tendo o Brasil enviado como seu primeiro representante o embaixador Murilo Gurgel Valente nesse mesmo ano. Em 1974, o governo saudita enviou a Brasília o embaixador Mamoun Kabbani. No final de 1973, seria instalada em Bagdá a embaixada brasileira, que daria novo dinamismo nas relações Brasil-Iraque. No ano seguinte desenvolver-se-iam as relações entre Brasil e Argélia, com a entrada da Braspetro no país e o inicio da exploração do petróleo argelino, além do incremento das relações na área dos transportes. No ano de 1974, os maiores movimentos comerciais foram atingidos no intercambio com a Argélia e a Líbia, cujo montante chegou a cerca de US$325 milhões. No entanto a balança comercial com este último era muito desequilibrada a favor do país africano. Este déficit cresceu nos anos seguintes e chegou em 1977, a quase três bilhões de dólares em favor dos árabes. Portanto, a aproximação com os países árabes, ao contrário do que muitos pensam, teve seu inicio com Médici e não com Geisel.Tal aproximação encaixava-se perfeitamente no tipo de relação Sul-Sul pretendido por Médici.

Mas obviamente foi Geisel que, devido à crise do petróleo, estreitou os laços comerciais com os países da região. Na época,a OPEP dividiu os países em amigos ou não da causa palestina, para não sofrer os efeitos do embargo o país precisava estar no primeiro grupo. Enquanto Médici posicionava-se de forma no mínimo ambígua em relação à resolução 242 da ONU que ordenava a retirada israelense dos territórios palestinos ocupados, o ministro Azeredo da Silveira, numa recepção ao ministro de negócios estrangeiros saudita Omar Al-Sakkaf, posicionou-se de forma inequívoca a favor da causa palestina e, em 1974, chegaria a fazer um discurso pró-palestino na XXIX Assembléia Geral da ONU. Em seu pronunciamento, Azeredo da Silveira afirmou que

[...]A objeção à guerra de conquista é uma constante na História do Brasil e um preceito em nossa Lei Fundamental. Consideramos absoluto o direito á integridade territorial e à obrigação de respeito à soberania. Em conseqüência, acreditamos que a desocupação doa territórios ocupados é, insofismavelmente, parte integrante da solução do conflito.

Assim, o governo brasileiro aceitava os direitos do povo palestino a autodeterminação e soberania como único caminho para uma paz duradoura na região. Na XXXI Assembléia Geral da ONU, o Brasil votou a favor de uma solução negociada entre árabes e israelenses, tendo como base a carta da ONU,posição que mantém até hoje.

sexta-feira, 2 de abril de 2010

A mudança de rota da China e o cerco se fecha ao Irã

Até agora dos cinco membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU (EUA,França,Grã-Bretanha,Rússia e China),apenas esta última vinha resistindo a penalizar o Irã. O comércio entre os dois países é da ordem de US$ 36,5 bilhões. O Irã importa bens de consumo e maquinário e exporta petróleo,gás e outros derivados do óleo. A China depende do Irã na geração de 11% de sua energia elétrica.
O embaixador da China em Teerã, Xie Xiaoyun chegou a afirmar que "as sanções não surtirão o efeito desejado não importa quão severas sejam". Era uma posição idêntica à do Brasil.Porém uma mudança de posição de Obama a respeito de assuntos estratégicos para a China pode fazer com que ocorra também uma mudança de Beijing em relação as sanções ao Irã.
Hu Jintao deixou claro que não aceitará interferência norte-americana na questão tibetana e de Taiwan. Segundo Jintao que demonstrou irritação com o fato de Obama ter recebido o líder tibetano Dalai Lama na Casa Branca em fevereiro, as questões de Taiwan e do Tibete são interesses básicos do país ligados à sua soberania e integridade territorial. Em troca do apoio as sanções, os chineses querem que os EUA aproveitem os encontros sobre segurança nuclear a serem realizados em Washington nos dias 12 e 13 de abril para trazer também a Coreia do Norte à mesa de negociações,que para os chineses é uma ameaça muito mais palpável que o Irã.
Em fevereiro o especialista em Oriente Médio da Academia Chinesa de Ciências Sociais disse em entrevista que as relações Irã-China são “superestimadas”. Segundo ele, “A China não manteria uma relação tão próxima com o Irã pois isso prejudicaria suas relações com muitos outros países." E a China,um país pragmático por excelência, que conseguiu criar um regime mezzo capitalista e mezzo comunista não irá sacrificar seus interesses pelo Irã.

terça-feira, 30 de março de 2010

Passeando pelo 25 de Março

No último dia 25 de março, o presidente Lula recebeu uma homenagem da comunidade árabe pelos serviços prestados à aproximação entre o País e o Mundo Arabe. Desde o início do governo Lula o intercâmbio comercial entre o Brasil e os países árabes aumentou 167%.
No evento, Lula recebeu o Grande Colar da Ordem do Mérito da Câmara de Comércio Árabe Brasileira das mãos de seu presidente, Salim Schahin. E ainda foi presenteado com um exemplar do Alcorão traduzido para o português, com "A Grande Faixa", comenda entregue pela primeira vez a uma autoridade brasileira, que ele recebeu do arcebispo metropolitano da Igreja Ortodoxa em São Paulo, Damaskinos Mansour, e com um presente do Conselho dos Embaixadores Árabes no Brasil. Já a primeira-dama, Marisa Letícia, recebeu uma benção na forma de ícone de Nossa Senhora.

Desde o início de seu primeiro mandato, em 2003, Lula definiu como prioridade a aproximação do Brasil com o mundo árabe. Naquele mesmo ano ele se tornou o primeiro presidente brasileiro, no exercício do cargo, a visitar a região. Viajou para o Líbano, Síria, Egito, Emirados Árabes Unidos e Líbia, e lançou a idéia de realizar a Cúpula América do Sul-Países Árabes (Aspa), cuja primeira edição ocorreu em 2005, em Brasília, e a segunda no ano passado, em Doha, no Catar. O terceiro encontro está programado para ocorrer em 2011, em Lima, no Peru.

Depois do primeiro giro pelo Oriente Médio, o presidente esteve também na Argélia, Arábia Saudita, mais uma vez na Líbia, para participar como convidado da Cúpula da União Africana, no Catar, para a 2ª Cúpula Aspa, e mais recentemente na Palestina e na Jordânia. Em maio ele voltará ao Catar para retribuir a visita que o emir Hamad Bin Khalifa Al-Thani fez ao Brasil em janeiro.

Sobre a última viagem, que incluiu também Israel, Schahin, que acompanhou o presidente na Palestina e Jordânia, disse que a receptividade foi “excepcional”. “Os frutos dessa viagem serão o aumento dos negócios, das relações políticas e culturais”, ressaltou. “E também para o processo de paz [entre israelenses e palestinos], que o Brasil, por meio do presidente Lula, deseja contribuir”, acrescentou.

Na seara econômica, as exportações brasileiras ao mundo árabe saíram de US$ 2,76 bilhões em 2003, segundo dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), para o pico de US$ 9,82 bilhões em 2008, e ficaram em US$ 9,4 bilhões em 2009, ano de crise e de retração no comércio exterior. Este ano, os negócios já voltaram a crescer. No primeiro bimestre, os embarques do Brasil ao mundo árabe renderam US$ 1,37 bilhão, um aumento de 33% sobre o mesmo período do ano passado.

25 de Março

Mas por que a homenagem no dia 25 de março? Bom, desde 2008, por força de lei aprovada no Congresso Nacional, a data marca o Dia Nacional da Comunidade Árabe. Para quem gosta de efemérides, 25 de março, no Brasil, é originalmente o Dia da Constituição, pois nesta data, em 1824, foi outorgada a primeira Constituição brasileira pelo imperador Dom Pedro I.
Mas 25 de Março é também o nome da mais famosa rua de comércio popular de São Paulo e onde muitos imigrantes árabes se estabeleceram. “O dia 25 de março é muito vinculado à colônia árabe, pois dá nome à rua que é conhecida no Brasil inteiro como ‘a rua dos árabes’”, disse o senador Romeu Tuma (PTB-SP), autor do projeto que criou o Dia Nacional da Comunidade Árabe.

Tuma, filho de pai sírio e mãe descendente de libaneses, faz parte dos 10% de parlamentares do Congresso Nacional que são de origem árabe. A comunidade é forte na política e conta ainda com cinco ministros no gabinete do presidente Lula.

A história da família de Tuma é parecida com as de muitos dos membros da colônia, hoje estimada em cerca de 12 milhões de pessoas. Seu pai iniciou a vida no Brasil como comerciante, vendendo mercadorias pelo interior, e depois se estabeleceu na 25 de Março com uma loja de armarinhos, tecidos e roupa de cama, mesa e banho.

O pesquisador norte-americano Clark Knowltown, em estudo sobre a imigração árabe no Brasil, fez levantamento estatístico indicando que em 1871, dois imigrantes com passaporte turco entraram no país, seguidos por outros oito em 1872, vinte e um em 1874, quinze em 1877, seis em 1880 e trinta e oito em 1881. Porém, segundo o diplomata saudita Mansour Saleh Al-Safi, que cita tal pesquisa em seu livro Arábia Saudita: Política Externa e Aspectos de sua Relação com o Brasil

"Apenas em 1892 as autoridades brasileiras começaram a registrar corretamente as nacionalidades, Aparecendo naquele ano 93 sírios como imigrantes e 196 outros em 1895.Até o final do século, 2.110 imigrantes do Oriente Médio tinham chegado ao Brasil, quer fossem eles registrados como “turcos”, ou sírios, libaneses, armênios, egípcios, marroquinos e argelinos, chegando aquele autor ao total de 106.184 imigrantes de 1871 a 1942."

Contudo, não devemos depositar confiança absoluta nestes dados, pois é fato bem conhecido que não só árabes viviam sob domínio turco e, portanto, outras etnias também portavam o passaporte turco. Muitos judeus vieram para o Brasil com tal documento, o que fez com que o povo os confundisse, e que a comunidade árabe tivesse que sofrer com a pecha muitas vezes imputadas aos judeus de “assassinos de Jesus”.
A propósito, o elemento religioso é muito importante para entendermos a imigração árabe. No final do século XIX, ela era quase toda cristã. Vivendo em países onde eram minorias, sentiam-se atraídos por países que unissem o Cristianismo como religião majoritária e a possibilidade de enriquecimento.
Por volta de 1890, o número de cristãos já era grande o suficiente para que se fizesse necessária a presença de padres do rito maronita e da Igreja Ortodoxa. E em 1896, um rabino sírio viria para fundar a primeira sinagoga carioca. Os muçulmanos árabes só fundariam a primeira mesquita quase cinco décadas depois, embora o Islã já tivesse chegado ao Brasil no final do século XVII, através dos escravos maleses.

Ao contrário de outras colônias como a alemã, que se fixou no sul do Brasil, e a italiana que radicou-se predominantemente em São Paulo, os árabes, não se fixaram em lugar algum. A dispersão árabe pelo Brasil acompanha os ciclos econômicos do País. Durante o ciclo da borracha, foram à Amazônia vender seus produtos aos barões locais. Quando foi a vez do café, seguiram rumo à São Paulo, Paraná e Mato Grosso. Revolucionaram o comércio popular com novidades para a época, como vendas à prazo e liquidações.
A maioria dos imigrantes era formada por moradores do campo ou lavradores, mas com uma multissecular experiência em negociar e intermediar vendas, preferindo atuar no que parecia mais propício à obtenção de lucros rápidos com os quais pretendiam voltar à seu pais de origem, pois nessas primeiras levas,o imigrante não considerava definitiva sua vinda ao Brasil.

Com o colapso do Império Otomano, ao final da Primeira Guerra Mundial, muitos retornam à sua terra, alimentando o ideal de ver o oriente médio livre. Porém, a decepção é grande. Inglaterra e França partilham a região entre si. A França ficou com Síria e Líbano, a Inglaterra com a Jordânia (então chamada Transjordânia) e Iraque. A Palestina ganhou o duvidoso status de “protetorado britânico”. Os árabes não estavam livres, mas apenas submetidos a um novo senhor. A partir deste ponto, a imigração deixa de ter caráter provisório. Abandonam o sonho de retornar ricos à sua terra e passam a buscar um lar definitivo na América. Os novos imigrantes encontravam os pioneiros já estabelecidos no comércio atacadista. Estes forneciam-lhes mercadoria e know-how para trabalhar na nova terra.

Alem de sírios e libaneses, houve outra imigração, bem mais recente, a dos palestinos, ocorrida a partir da década de 1970, portanto pouco após a ocupação dos territórios palestinos por forças israelenses, e de distúrbios ocorridos na Síria e no Líbano. Embora este movimento de refugiados palestinos já existisse desde a criação de Israel, em 1948, é depois da Guerra dos Seis Dias, que este se intensifica. Muitos desses palestinos fixaram-se em São Paulo, Porto Alegre e no Distrito Federal.

Entre os imigrantes do século XX, estavam professores, jornalistas, escritores, etc. Durante o Estado Novo, surgiu uma associação de escritores árabes chamada “Nova Andaluzia”, que teve que ser extinta devido à política xenófoba do governo Vargas. Também na vida pública os árabes se destacaram. Nomes como o de Francisco Rezek, Antonio Kandir, Ibrahim Eris, Espiridião Amin,José Richa e o já citado Romeu Tuma, dentre outros, destacaram-se na política nacional e demonstram a mobilidade social que o imigrante árabe obteve neste país. Com um segmento populacional tão significativo, composto por imigrantes bem sucedidos nos negócios e na política, é natural observar que o Brasil mantêm relações comerciais com o mundo árabe desde o aparecimento das nações árabes modernas.
No próximo post falaremos sobre essas relações...

quinta-feira, 25 de março de 2010

Amorim e diretor da AIEA divergem sobre negociação com Irã

O ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, e o diretor-geral da AIEA (Agência Internacional de Energia Atômica), Yukiya Amano, demonstraram divergências quanto ao rumo das negociações sobre o programa nuclear do Irã, em entrevista conjunta no Rio.
O japonês Amano, que assumiu o cargo há quatro meses e é considerado mais alinhado aos EUA que seu antecessor, o egípcio Mohammed El Baradei, também fez pressão discreta para que o Brasil assine um protocolo adicional ao TNP (Tratado de Não Proliferação), ampliando o alcance das inspeções da AIEA nas instalações nucleares brasileiras.

O diretor da agência atômica da ONU disse que "continua na mesa" a proposta para que o Irã troque seu estoque de urânio com baixo enriquecimento por combustível enriquecido a 20%, destinado a abastecer seu reator para uso médico -o plano evitaria que os iranianos usem o estoque para construir uma bomba.
Mas Amano deixou claro que não pretende ou não tem apoio no momento para atualizar a proposta no sentido sugerido por Amorim, de que a troca simultânea, como quer Teerã, seja feita por intermédio de um terceiro país, como a Turquia, que tenha a confiança do Ocidente e dos iranianos.
Mesmo com um "convite em aberto", ele disse não ter "plano ou data particulares" para visitar o Irã -iniciativa que, segundo disse Amorim à Folha anteontem, daria novo impulso à negociação. "Não posso ir a Teerã para dizer oi, preciso ter algo político para discutir. Negociamos discretamente, por vários canais, e outros países, como Brasil e Turquia, estão falando com os interessados."
O diretor da AIEA indicou ainda que sua prioridade é que o Irã "esclareça" as suspeitas levantadas no relatório divulgado por ele no mês passado. Embora, afirmou, o texto não acuse o país de ter um programa militar secreto, é preciso que os iranianos se disponham a "conversar" sobre o tema, o que não fazem desde 2008.
O chanceler brasileiro, no entanto, tem posição inversa. Para ele, um acordo para a troca de combustível é que poderia melhorar a relação entre o Irã e a AIEA. "Achamos que é preciso haver cooperação. Para que haja cooperação, seria positivo que o acordo avançasse. Haveria mais clima para a discussão de outras questões."
Mesmo admitindo que a AIEA tem de sanar as dúvidas sobre o Irã, a diplomacia brasileira avalia que o relatório de Amano recicla suspeitas velhas, citando "estudos alegados" feitos por agências de espionagem não nomeadas.
"A questão é ser cuidadoso, porque você pode ser ingênuo por acreditar muito no Irã ou por acreditar muito nas agências de informação de outros países", afirmou Amorim.

Ele voltou a citar o Iraque, "quando foi preciso pelo menos 200 mil pessoas mortas" para se concluir que não havia armas de destruição em massa.
Amano, que visitou a fábrica de urânio enriquecido da INB (Indústrias Nucleares do Brasil), falou do protocolo adicional no início da entrevista. "O protocolo reforça a capacidade de verificação da agência, e eu gostaria de ver um número máximo de países aderindo."
A posição brasileira é a de só negociar um protocolo do tipo numa barganha em que as potências nucleares se comprometam com o desarmamento, como prevê o TNP. O país afirma ainda que suas instalações estão sob escrutínio suficiente, da AIEA e da Abacc (Agência Brasileiro-Argentina de Controle e Contabilidade).

Fonte: Folha de S. Paulo

Jundallah e o "terrorismo do bem"

O governo iraniano está comemorando a captura de Abdul Malek Rigi, o líder de um grupo chamado Jundallah ( Soldados de Deus, em árabe), que Teerã diz ser uma organização terrorista apoiada pelos Estados Unidos, Grã-Bretanha e Israel. O Jundallah vêm há algum tempo realizando ataques violentos a bomba contra o regime islâmico do Irã com o objetivo de desequilibrá-lo.É formado por árabes do Baluquistão,no sudeste do país, próximo a fronteira com o Afeganistão e o Paquistão,e tem recebido apoio do Talebã em seus ataques. O Jundallah alega que sua finalidade é proteger os direitos da minoria sunita no Irã.

Em um artigo de 7 de julho de 2008, para a revista New Yorker, o jornalista investigativo Seymour Hersh citou Robert Baer, um ex-agente da CIA que trabalhava clandestino no sul da Ásia e do Oriente Médio durante quase duas décadas, que afirmou que o Jundallah era um grupo militante iraniano que contava com o apoio dos EUA. Hersh também informou que o presidente George W. Bush assinou um documento em finais de 2007 que foi autorizada a liberação de cerca de US $ 400 milhões para operações secretas destinadas a desestabilizar o governo do Irã, em parte, do apoio a organizações militantes de oposição.

Outro grupo identificado como um tendo "laços de longa data" com a CIA e os EUA foi o Mujahedin-e-Khalq, ou MEK, que está na lista do Departamento de Estado dos grupos terroristas. O Mujahedin já contou com apoio norte-americano no início da década de 1980,quando realizou diversos atentados contra membros-chave do governo revolucionário,inclusive matando Mohamed Beheshti,o então braço direito de Khomeini e ferindo gravemente o atual Líder Supremo Ali Khamenei. O Mujahedin chegou ao extremo de lutar do lado de Saddam Hussein na Guerra Irã-Iraque.

Mas o Jundallah foi poupado dessa designação, uma possível indicação de que o governo norte-americano encara-o como um aliado valioso para o confronto contra o Irã, ou no jargão da "guerra ao terror", como um dos "mocinhos". O General Mizra Aslam, ex- chefe do Exército do Paquistão, acusou os EUA de apoiar o Jundallah com treinamento e outras ajudas. Mas o governo EUA nega que tenha ajudado Rigi, ou o seu grupo.

Desde sua captura,no início do mês,Rigi foi tecendo histórias sobre seus contatos com autoridades americanas. Segundo a TV iraniana, Rigi disse que os Estados Unidos prometeram Jundallah ajuda militar em apoio da sua revolta contra a República Islâmica do Irão. O líder capturado descreveu contatos supostamente ocorridos em março de 2009, em que os representantes EUA "disseram que vão cooperar conosco e nos dar equipamentos militares, armas e metralhadoras. Eles também prometeram-nos uma base ao longo da fronteira do Afeganistão com o Irã . Rigi afirmou que os representantes norte-americanos disseram que um ataque direto sobre o Irã seria muito caro e que a CIA no momento preferia apoiar grupos militantes que poderiam desestabilizar o país:”Os americanos disseram : o nosso problema com o presente é o Irã ... não a al-Qaeda ou os talibãs , mas o Irã, e pretendemos auxiliar todos os grupos que tenham capacidade para criar dificuldades ao atual regime”, disse Rigi, segundo a Press TV.

Os holofotes indesejáveis sobre Rigi e o Jundallah ameaça trazer à tona uma estratégia mais ampla dos EUA e de Israel para a mudança de regime em Teerã, um objetivo que remonta pelo menos ao presidente Bush no célebre discurso sobre o "eixo do mal" em 2002.

Segundo essa análise, o medo de que o Irã adquira armas nucleares é a grande razão para o aumento da tensão.Neste cenário, "bons” terroristas como o Jundallah poderiam ser recrutadas para outros fins que não a violência simples. Poderiam ser usados por exemplo para sabotar qualquer resposta favorável aos esforços do presidente iraniano aos apelos de Barack Obama para a negociação.

E este é precisamente o que fez Jundallah outubro do ano passado, logo após o governo de Ahmadinejad, dar uma prova tangível de que estava disposto a negociar em resposta ao apelo de Obama.Em primeiro de outubro de 2009, Teerã surpreendeu praticamente a todos ao concordar em enviar cerca de 75% do seu urânio pouco enriquecido no exterior para ser transformado em combustível para um reator de pequeno porte que produz isótopos médicos.

Mesmo o New York Times reconheceu que " se isso acontecer, representaria uma grande conquista para o Ocidente, reduzindo a capacidade do Irã de fabricar uma arma nuclear rapidamente, e mais tempo para as negociações começarem a dar frutos."
Invertendo a alergia a administração Bush para falar com os "maus", Obama enviou então o subsecretário de Estado William Burns à reunião de Genebra. Os 45 minutos de tete-à-tête entre Jalili e Burns marcou o mais alto nível de conversações entre Irã e EUA nas últimas três décadas.

Jalili também manifestou a concordância do Irã para abrir as instalações de enriquecimento de urânio perto da cidade de Qom à inspeção internacional dentro de duas semanas, o que Teerã de fato fez.
No entanto, em 18 de outubro de 2009, Jundallah detonou um carro-bomba em uma reunião dos principais comandantes da Guarda Revolucionária iraniana e líderes tribais na província do Baluquistão, e montou um ataque na estrada em um carro cheio de guardas no mesmo área.

O comandante general de brigada, que foi adjunto das forças terrestres da Guarda Revolucionária, o brigadeiro comandante no Baluquistão, três comandantes de brigada e dezenas de outros oficiais militares e civis foram mortos ou feridos. O Jundallah assumiu a autoria dos atentados, incluindo uma tentativa de emboscada da comitiva do presidente Mahmoud Ahmadinejad como ele passou pelo Baluquistão, em 2005.

O ataque de 18 de outubro o mais sangrento no Irã desde a guerra de 1980-88 com o Iraque veio um dia antes das negociações fossem retomadas pela Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) .Imediatamente a Guarda Revolucionária foi falar diretamente com o seu patrono, o líder supremo Ali Khamenei, acusando o Ocidente de não ser confiável. Khamenei emitiu uma declaração em 19 de outubro condenando os terroristas, e afirmando que o Jundallah é “apoiado por agências de certas potências arrogantes".

“Coincidentemente”,desde este atentado pouco divulgado no Ocidente,os iranianos retrocederam em seu compromisso anterior de exportar a maioria de seu urânio enriquecido.

sábado, 20 de março de 2010

Brasil interpõe-se entre Israel e o Irã

Pepe Escobar, do Asia Times Online

Por falar em Via Dolorosa, Luiz Inacio Lula da Silva foi o primeiro presidente do Brasil a visitar oficialmente Israel. Louvado por seu carisma, habilidade e formidáveis capacidades de negociador – Obama, dos EUA, refere-se a ele como “O cara” –, mal sabia o presidente Lula que, para conseguir conversar seu anfitrião, essa semana, teria de passar a perna no próprio profeta Abraão em pessoa, nada mais, nada menos.

Ao fim e ao cabo, Lula não se deixou enrolar. Não fez concessões. E, diferente do vice-presidente dos EUA Joseph Biden, semana passada, conseguiu não ser humilhado publicamente pelos donos da casa.

Lula é homem habituado a enfrentar interlocutores duros. Avigdor Lieberman, ministro de Negócios Internacionais de Israel, boicotou seu discurso no Parlamento e o encontro com o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu. O motivo: Lula não visitou o túmulo do fundador do sionismo Theodor Herzl. Ora essa! Nem Nicolas Sarkozy da França, nem Silvio Berlusconi da Itália visitaram o tal túmulo, quando visitaram Israel.

Brasília – como Paris e Roma – sabe muito bem que visitar túmulos não é obrigatório em viagens presidenciais. Ainda assim, um coro dos colonos judeus sionistas fanáticos do partido Likud em Israel não mediu palavras para ‘diagnosticar’ que a não-visita feriria de morte a competência do governo do Brasil para atuar com o mediador no conflito Israel-Palestina.

Lula ovacionado

No Parlamento, Lula enfrentou tentativa de linchamento, inclusive por Netanyahu, por sua política de não-confrontação e de diálogo com o Irã. O presidente do Brasil nem piscou. Condenou, com igual peso, tanto o holocausto quanto o terrorismo; lembrou os donos da casa que o Brasil e a América Latina têm posição assumida contra as armas nucleares; insistiu nas vias do “diálogo” e da “compaixão” para superar o conflito no Oriente Médio; defendeu uma solução viável de dois Estados para Israel e Palestina. Nem por isso deixou de criticar as construções de casas exclusivas para judeus em Jerusalém Leste. Foi ovacionado. Segundo depoimento de deputados israelenses, “foi muito mais aplaudido que George W. Bush”.

O profeta tropical

Nem que encarnasse o Abraão dos Abraões, Lula conseguiria convencer os sionistas fanáticos e seus lugares-tenentes. Mas, sim, Lula disse ao jornal israelense Ha’aretz o que os atores mais sérios no Oriente Médio já sabem mas não dizem; o “processo de paz” está sem rumo; não há outra alternativa além de incluir novos mediadores na mesa de negociação – parceiros novos, como o Brasil.
O mesmo se aplica à discussão do dossiê iraniano: “Os líderes mundiais com os quais conversei creem que temos de agir rapidamente, ou Israel atacará o Irã.” Lula está convencido de que novas sanções contra o programa nuclear iraniano serão contraproducentes. E suas palavras ecoaram pelo planeta: “Não podemos permitir que aconteça no Irã o que aconteceu no Iraque. Antes de novas sanções, temos de tentar, por todos os meios possíveis, construir a paz no Oriente Médio”.
A visão oficial do governo do Brasil – que ecoa e é ouvida em praticamente toda a comunidade internacional (vale dizer, não só no clube exclusivo de Washington e entre os suspeitos europeus de sempre) – é que nada, até agora, foi satisfatoriamente discutido com o Irã, sobre seu dossiê nuclear. Lula foi muito firme e claro: o Irã tem, sim, direito de desenvolver um programa nuclear para fins pacíficos nos termos admitidos pelo Tratado de Não Proliferação Nuclear do qual o país é signatário.

O Brasil ocupa hoje um dos assentos do Conselho de Segurança da ONU. Como a China, o país também não aprova e não apoiará novas sanções que os EUA querem impor ao Irã – e diga o que disser o secretário de Estado Robert Gates, que anda espalhando boatos de que os EUA já teriam os votos necessários para aprovar uma quarta rodada de sanções, porque a Arábia Saudita teria afinal convencido a China. A China jamais votará contra seus próprios interesses de segurança nacional – e o Irã é, sim, assunto de segurança nacional para os chineses.
Em maio, Lula estará em Teerã e, outra vez, reunir-se-á com o presidente Mahmud Ahmadinejad. Os sionistas linha-dura estão – como é rotina – fumegando.
Lula sabe muito bem que as chamadas “sanções espertas” [ing. smart sanctions], que visam principalmente o Corpo dos Guardas Revolucionários Islâmicos [ing. Islamic Revolutionary Guards Corps (IRGC)] – que controla o centro do poder econômico e político no Irã – também afetarão milhões de civis conectados às empresas e negócios controladas pelo IRGC, ou seja, imporá novos sofrimentos à população em geral, que já paga o alto preço imposto pelas atuais sanções. O IRGC controla pelo menos 60 portos no Golfo Persa. Impedir que a Ásia negocie c om o Irã implica bloqueio naval. E bloqueio naval é declaração de guerra.

Não pressionar o Irã

Lula chega ao Oriente Médio em conjuntura muito especial: no momento em que o governo de Netanyahu decidiu construir mais casas exclusivas para judeus em Jerusalém Leste e na Cisjordânia, mesmo ao preço de perder o apoio crucial dos EUA no front iraniano.
Ironicamente, o Brasil pode estar começando a seduzir o establishment israelense, mas mais no front econômico, que no front geopolítico.
Israel assinou um acordo de livre-comércio [ing. “free-trade agreement” (FTA)] com o Mercosul[2] – o quinto maior bloco em termos de produto interno bruto. O acordo não agradou aos palestinos, para quem o FTA que foi assinado fortalecerá o complexo industrial-militar de Israel.
E é nesse momento que o Brasil diz bem claramente que defende um Estado palestino viável, nos limites das fronteiras demarcadas em 1967. Esse acordo de livre-comércio implica uma cláusula estratégica: permite transferir tecnologia de armas aos países-membro do Mercosul. As armas que fazem a repressão em Gaza estarão, em pouco tempo, disponíveis na América Latina.

Num front paralelo, ao elogiar o papel do Brasil como mediador, o presidente Shimon Peres sugeriu pessoalmente a Lula que o Brasil fizesse coincidir, em território brasileiro, duas visitas: do presidente da Síria Bashar al-Assad e a de Netanyahu. Assad visitará o Brasil ainda esse ano; e, na semana corrente, Netanyahu também aceitou convite para visitar o Brasil. Uma reunião tropical, informal, entre Síria e Israel, poderia criar a circunstância ideal para começar a quebrar o gelo. Lula e Netanyahu organizaram um sistema bilateral de encontro entre chefes de Estado e principais ministros a cada dois anos.

Mas… e quanto aos EUA, em tudo isso? Há vigente hoje um acordo estratégico entre EUA e Brasil, pelo qual estão previstos dois encontros de nível ministerial (ministérios de Relações Exteriores) por ano, um nos EUA, outro no Brasil.
O ministro brasileiro de Relações Exteriores chanceler Celso Amorim tem excelentes relações com a secretária de Estado dos EUA, Hillary Clinton. Em recente visita ao Brasil, Clinton insistiu muito fortemente para que Lula e Amorim apoiassem nova rodada de sanções contra o Irã. Os brasileiros recusaram polidamente e firmemente.
À Clinton restou a alternativa de reclamar, em conferência de imprensa, que o Irã estaria “usando” o Brasil, a Turquia e a China para escapar das sanções. Amorim, por sua vez, sempre lembra o desastre iraquiano: “Eu era embaixador na ONU nos dias críticos das decisões sobre o Iraque. E o que nós vimos lá foi um enorme erro.”
Lula foi meridianamente claro e específico: “Não é inteligente empurrar o Irã contra a parede. Quero para o Irã o que quero para o Brasil: usar a energia nuclear para fins pacíficos. Se o Irã for além disso, então não aceitaremos.” Exatamente a posição dos chineses.

Lula e Obama deram sinais de estar em sincronia sobre o Irã, desde o encontro que tiveram durante uma reunião dos Grupo dos 8+5 em Aquila, Itália, há nove meses. Então, Obama chegou a encorajar o diálogo Brasília-Teerã, desde que o Brasil pressionasse o Irã a aceitar o compromisso de manter seu programa nuclear estritamente para finalidades pacíficas. Foi exatamente o que Lula disse a Ahmadinejad quando se encontraram no Brasil. O que mudou foi a posição do governo de Obama, o qual, depois daqueles dias endureceu muito.
Os diplomatas brasileiros insistem que Ahmadinejad jamais fechou a porta a negociações. Em encontros diplomáticos bilaterais discretos, funcionários dos EUA admitem a diplomatas brasileiros que Ahmadinejad não é, de modo algum, intransigente; como tampouco é intransigente o Líder Supremo Aiatolá Ali Khamenei. Em discurso de 19 de fevereiro no batizado de um destróier iraniano, Khamenei mais uma vez negou que o Irã esteja trabalhando para ter armas atômicas; e destacou que as armas atômicas são ilegais, nos termos da lei islâmica, porque sempre mataram grande número de civis inocentes.
O problema, se não foi inventado, foi, no mínimo, muito aumentado pela mídia dos EUA e Europa. Por causa disso, a própria Clinton, em momento de rara sinceridade, durante viagem à América Latina, teve de admitir que as sanções ainda demorariam “vários meses” para ser implantadas, se o forem.
Mesmo antes da visita de Clinton, o ministro das Relações Exteriores do Irã Manouchehr Mottaki já admitira a jornalistas brasileiros, sem pedir sigilo, que o Brasil poderia ser uma “ponte” entre o Irã e a frente EUA-União Europeia, por causa da “posição realista” do governo e da diplomacia brasileira. Mottaki não vê o Brasil como “mediador”. Prefere falar de “um facilitador de consultas”, uma vez que Teerã entende que nenhum outro país deva falar pelos interesses iranianos.
Brasília tampouco pediu para mediar coisa alguma. Mottaki informou que ele próprio tem “trabalhado substancialmente, fazendo diplomacia telefônica” com o chanceler Amorim. Teerã evidentemente vê os benefícios de estabelecer um canal de diálogo com o ocidente industrializado mediante um país em desenvolvimento.

Os BRICs como a nova superpotência

A estratégia do presidente Lula de tentar posicionar-se como uma “ponte” é especialmente bem-vinda, uma vez que o dossiê iraniano está chegando a fase crucial, na qual as facções mais linha-dura do bloco EUA-UE-Israel estão fazendo de tudo para desmentir e apagar qualquer prova (mesmo dos serviços de inteligência) de que o Irã não está construindo bomba alguma; e já houve tentativas sistemáticas de ‘corrigir’ informes de inteligência para que sirvam como ‘prova’ do oposto do que de fato comprovam (ecos do Iraque?).

A entrada de Lula nesse cenário e arena também implica maior destaque para os BRICs (Brasil, Rússia, Índia, China), que já atuam como uma nova superpotência – ante uma ‘dominação’ cada vez mais desorientada e sem rumo, dos EUA. Nenhum dos BRICs é favorável ao isolamento do Irã; muito mais contrários são, é claro, a qualquer ataque ao Irã. E assim continuará, enquanto acreditarem que o Irã realmente não está próximo de construir sua bomba atômica, como o comprovam montanhas de evidências; nesse caso, um ataque ao Irã terá o efeito altamente indesejável de acelerar a proliferação nuclear no Golfo Persa.

Os BRICs também sabem que EUA e Irã podem, sim, se entender bem e bem rapidamente, mesmo nas questões mais espinhosas. Por exemplo, sobre o Afeganistão.
Só resta, pois, sobre a mesa, a estratégia do elefante na loja de porcelanas, de Israel. É hora de os BRICs pagarem para ver o jogo de Israel.
Se o governo de Netanyahu pode humilhar Obama e Biden no que digam sobre expansão de colônias exclusivas para judeus em Jerusalém Leste e na Cisjordânia, é razoável assumir que ignorará todas as súplicas do comandante do Estado-maior do Exército dos EUA Mike Mullen, que já disse repetidas vezes que qualquer ataque contra o Irã criará “problemas grandes, grandes, muito grandes, para todos nós”.
Israel (e também Washington) pode estar querendo apenas uma mudança de regime no Irã – que, sim, pode ser bem útil e necessária. Para isso, pode usar armas atômicas táticas e destruir as instalações nucleares do Irã. É possível que Israel esteja pronta para declarar outra guerra preventiva (conceito e ideia desenvolvidos em Israel e completamente encampados pelo governo de George W Bush). Claro que os israelenses contam com apoio logístico e político dos EUA.

Lula não avançou até tão longe. Mas o posicionamento do governo Lula do Brasil contêm embriões de todas essas espinhosas questões com as quais os BRICs devem fazer frente a Israel. Então, sim, quando isso acontecer, todo o planeta saberá que rabo, afinal, está mesmo sacudindo o cachorro.


Pepe Escobar[1] é autor de Globalistan: How the Globalized World is Dissolving into Liquid War [O Globalistão: Como o mundo globalizado está se dissolvendo em guerra líquida] (Nimble Books, 2007) e Red Zone Blues: a snapshot of Baghdad during the surge [O blues da Zona Vermelha: instantâneos de Bagdá sob ataque]. Acaba de lançar Obama does Globalistan [Obama cria globalistões] (Nimble Books, 2009).

Colaborou: Francisco Ferraz