quinta-feira, 25 de março de 2010

Amorim e diretor da AIEA divergem sobre negociação com Irã

O ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, e o diretor-geral da AIEA (Agência Internacional de Energia Atômica), Yukiya Amano, demonstraram divergências quanto ao rumo das negociações sobre o programa nuclear do Irã, em entrevista conjunta no Rio.
O japonês Amano, que assumiu o cargo há quatro meses e é considerado mais alinhado aos EUA que seu antecessor, o egípcio Mohammed El Baradei, também fez pressão discreta para que o Brasil assine um protocolo adicional ao TNP (Tratado de Não Proliferação), ampliando o alcance das inspeções da AIEA nas instalações nucleares brasileiras.

O diretor da agência atômica da ONU disse que "continua na mesa" a proposta para que o Irã troque seu estoque de urânio com baixo enriquecimento por combustível enriquecido a 20%, destinado a abastecer seu reator para uso médico -o plano evitaria que os iranianos usem o estoque para construir uma bomba.
Mas Amano deixou claro que não pretende ou não tem apoio no momento para atualizar a proposta no sentido sugerido por Amorim, de que a troca simultânea, como quer Teerã, seja feita por intermédio de um terceiro país, como a Turquia, que tenha a confiança do Ocidente e dos iranianos.
Mesmo com um "convite em aberto", ele disse não ter "plano ou data particulares" para visitar o Irã -iniciativa que, segundo disse Amorim à Folha anteontem, daria novo impulso à negociação. "Não posso ir a Teerã para dizer oi, preciso ter algo político para discutir. Negociamos discretamente, por vários canais, e outros países, como Brasil e Turquia, estão falando com os interessados."
O diretor da AIEA indicou ainda que sua prioridade é que o Irã "esclareça" as suspeitas levantadas no relatório divulgado por ele no mês passado. Embora, afirmou, o texto não acuse o país de ter um programa militar secreto, é preciso que os iranianos se disponham a "conversar" sobre o tema, o que não fazem desde 2008.
O chanceler brasileiro, no entanto, tem posição inversa. Para ele, um acordo para a troca de combustível é que poderia melhorar a relação entre o Irã e a AIEA. "Achamos que é preciso haver cooperação. Para que haja cooperação, seria positivo que o acordo avançasse. Haveria mais clima para a discussão de outras questões."
Mesmo admitindo que a AIEA tem de sanar as dúvidas sobre o Irã, a diplomacia brasileira avalia que o relatório de Amano recicla suspeitas velhas, citando "estudos alegados" feitos por agências de espionagem não nomeadas.
"A questão é ser cuidadoso, porque você pode ser ingênuo por acreditar muito no Irã ou por acreditar muito nas agências de informação de outros países", afirmou Amorim.

Ele voltou a citar o Iraque, "quando foi preciso pelo menos 200 mil pessoas mortas" para se concluir que não havia armas de destruição em massa.
Amano, que visitou a fábrica de urânio enriquecido da INB (Indústrias Nucleares do Brasil), falou do protocolo adicional no início da entrevista. "O protocolo reforça a capacidade de verificação da agência, e eu gostaria de ver um número máximo de países aderindo."
A posição brasileira é a de só negociar um protocolo do tipo numa barganha em que as potências nucleares se comprometam com o desarmamento, como prevê o TNP. O país afirma ainda que suas instalações estão sob escrutínio suficiente, da AIEA e da Abacc (Agência Brasileiro-Argentina de Controle e Contabilidade).

Fonte: Folha de S. Paulo

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