segunda-feira, 5 de abril de 2010

Relações do Brasil com o Mundo Árabe-parte II

O mundo árabe ocupa um território de 12.911,94 milhões de quilômetros quadrados, e cerca de trezentos milhões de habitantes estendendo-se por 85% da faixa entre o Mediterrâneo, Golfo Pérsico, Mar Vermelho e Mar da Arábia (os outros 15% são ocupados por Irã e Israel). Divide-se em duas sub-áreas: a primeira, chamada Maghreb (Ocidente), compreende o norte da África, ou seja: Marrocos, Tunísia, Líbia e Argélia. A segunda, denominada Macharek, (Oriente), inclui Egito, Kuwait, Iraque, Jordânia, Líbano, Síria, Iêmen, Emirados Árabes Unidos, Sudão e Arábia Saudita.
Após o estabelecimento de relações diplomáticas com o Egito, os próximos países com quem o Brasil estreitou os laços foram Líbano (1946), e Síria (1952). Estas eram justificadas pela grande colônia sírio-libanesa presente no país, a qual tinha estabelecido canais de comércio e exportação com seus países de origem, através de contatos de parentesco e amizade. Para se ter uma idéia, em 1968, cerca de 60% das exportações brasileiras ao mundo árabe eram dirigidas ao Líbano.

Em 1961, o Brasil estabelece relações com Marrocos, Tunísia e Argélia. Esta decisão foi muito criticada na época, devido à sua falta de sentido prático. E realmente, após seis anos, não havia sido constatada nenhuma relação comercial entre o Brasil e estes países norte africanos. O Brasil importava relativamente muito (5% de suas importações, basicamente fosfato, petróleo e potassa), e exportava pouco, criando assim um déficit em sua balança comercial.
Dentro da ótica comercial brasileira, no entanto, o Iraque era considerado comercialmente mais interessante do que o grupo formado por Síria, Líbano e países do Maghreb. A Arábia Saudita também foi encarada como parceira em potencial, tendo o Brasil iniciado contatos preliminares com os sauditas em 1967.
As primeiras tentativas de ingresso do Brasil nos mercados árabes não foram bem-sucedidas, devido ao desconhecimento mútuo entre economias e culturas tão distintas . Ambos os lados demonstravam interesse em incrementar o comércio, mas a conexão entre os setores técnicos e produtivos não era eficiente. Porém,na década de 1970havia três boas razões para o Brasil querer ingressar no mercado árabe:
a) Ter acesso a um mercado maior que o brasileiro tanto em população quanto em poder aquisitivo.
b) Por ser um mercado supridor dos minerais que o Brasil precisava como petróleo, potassa e fosfato a preços que eram de três a cinco vezes inferiores ao mercado interno brasileiro.
c) Acesso direto ao mercado de capitais dos países produtores de petróleo.

Obviamente que antes da década de 1970,já era importante preencher este último quesito.No entanto,a crise do petróleo o transformou numa necessidade.Foi proposto um programa para criar incentivos que rompessem aquele imobilismo: a criação de transações diretas tanto de venda quanto de compra, evitando intermediários e com a finalidade de estimular a criação de escritórios brasileiros naqueles países, assim como a criação de firmas locais brasileiras; o estabelecimento de empresas brasileiras em zonas francas árabes, como: Tanger, Bizerta, Port Said e Beirute, e a criação de linhas de crédito para importação e exportação. No entanto, já era consenso a idéia de que o conhecimento mútuo por meio da diplomacia era a melhor tática. A princípio, o Brasil estabeleceu representação em Tunis, que respondia também pelo Marrocos, Argélia, Líbia e obviamente a própria Tunísia; Cairo que alcançava Egito, Sudão, Kuwait e Iêmen; Beirute que abrangia Líbano, Chipre, Jordânia, Síria, Arábia Saudita e Iraque; e Karachí, que abrangia os Emirados Árabes Unidos, Catar, Bahrein, Omã e Paquistão. Na época foram propostos também cursos de comércio exterior a serem ministrados no Itamaraty voltados para o mercado árabe, similares a outros já existentes nos EUA e Europa.

Em 1968, o Brasil deu início às relações diplomáticas com a Arábia Saudita, ficando a embaixada brasileira no Líbano encarregada de responder pelas ligações com Riad. Em contrapartida, as relações diplomáticas sauditas com o Brasil e América Latina eram administradas desde sua embaixada em Washington (EUA). No entanto, em 1973, foi decidido que os dois países trocariam embaixadores, tendo o Brasil enviado como seu primeiro representante o embaixador Murilo Gurgel Valente nesse mesmo ano. Em 1974, o governo saudita enviou a Brasília o embaixador Mamoun Kabbani. No final de 1973, seria instalada em Bagdá a embaixada brasileira, que daria novo dinamismo nas relações Brasil-Iraque. No ano seguinte desenvolver-se-iam as relações entre Brasil e Argélia, com a entrada da Braspetro no país e o inicio da exploração do petróleo argelino, além do incremento das relações na área dos transportes. No ano de 1974, os maiores movimentos comerciais foram atingidos no intercambio com a Argélia e a Líbia, cujo montante chegou a cerca de US$325 milhões. No entanto a balança comercial com este último era muito desequilibrada a favor do país africano. Este déficit cresceu nos anos seguintes e chegou em 1977, a quase três bilhões de dólares em favor dos árabes. Portanto, a aproximação com os países árabes, ao contrário do que muitos pensam, teve seu inicio com Médici e não com Geisel.Tal aproximação encaixava-se perfeitamente no tipo de relação Sul-Sul pretendido por Médici.

Mas obviamente foi Geisel que, devido à crise do petróleo, estreitou os laços comerciais com os países da região. Na época,a OPEP dividiu os países em amigos ou não da causa palestina, para não sofrer os efeitos do embargo o país precisava estar no primeiro grupo. Enquanto Médici posicionava-se de forma no mínimo ambígua em relação à resolução 242 da ONU que ordenava a retirada israelense dos territórios palestinos ocupados, o ministro Azeredo da Silveira, numa recepção ao ministro de negócios estrangeiros saudita Omar Al-Sakkaf, posicionou-se de forma inequívoca a favor da causa palestina e, em 1974, chegaria a fazer um discurso pró-palestino na XXIX Assembléia Geral da ONU. Em seu pronunciamento, Azeredo da Silveira afirmou que

[...]A objeção à guerra de conquista é uma constante na História do Brasil e um preceito em nossa Lei Fundamental. Consideramos absoluto o direito á integridade territorial e à obrigação de respeito à soberania. Em conseqüência, acreditamos que a desocupação doa territórios ocupados é, insofismavelmente, parte integrante da solução do conflito.

Assim, o governo brasileiro aceitava os direitos do povo palestino a autodeterminação e soberania como único caminho para uma paz duradoura na região. Na XXXI Assembléia Geral da ONU, o Brasil votou a favor de uma solução negociada entre árabes e israelenses, tendo como base a carta da ONU,posição que mantém até hoje.

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