segunda-feira, 17 de maio de 2010

Cautela...

O Acordo Trilateral Brasil-Irã-Turquia foi uma vitória da diplomacia,mas que deve ser vista com as devidas reservas.Deve-se destacar que dificilmente o acordo sairia sem a participação do primeiro-ministro turco Recep Tayyip Erdogan,que deu as garantias a Teerã da devolução do urânio que deverá ser enriquecido a 20%.Tal acordo deverá esfriar por ora a implementação de sanções,se o Irã cumprir sua parte.

Os mais céticos afirmam que o Irã ganha tempo para desenvolver secretamente um programa com fins militares,porém é de se pensar se o governo de Teerã manipularia assim dois dos únicos países que apoiam abertamente seu programa nuclear,justamente Brasil e Turquia. Se as expectativas mais pessimistas se confirmarem aí sim o irã ficaria definitivamente isolado e ninguém mais o defenderia das sanções.

Trata-se de uma discussão altamente ideologizada. Aqueles que são a favor das sanções partem da premissa de que nenhum país islâmico é confiável (com a possível exceção da Turquia,país-membro da OTAN,e que tem boas relações com EUA e Israel)e que o Irã manterá seu programa nuclear de forma clandestina. É possível. Mas não há evidências concretas a favor deste argumento,a não ser aquilo que o intelectual palestino Edward Said chamava de "wishful thinking", uma belíssima expressão de dificil tradução, mas que significa tomar os próprios desejos como realidade e basear suas decisões e raciocínios nesses desejos e não nos fatos,manipulando argumentos para que aquilo que queremos ou esperamos aconteça.
Ou seja, se os falcões israelenses decidirem lançar um "ataque preventivo" ao Irã não importa o que o regime de Teerã faça todos os gestos serão publicamente interpretados como "traiçoeiros" e "mentirosos" porque a decisão já está tomada de antemão. Assim ocorreu com o Iraque. Mesmo com os relatórios não-conclusivos dos inspetores da ONU acerca das armas de destruição em massa nunca encontradas, a administração Bush já havia decidido pela invasão e já movimentava tropas no Golfo Pérsico meses antes da invasão,gastando bilhões de dólares num projeto o qual não voltariam mais atrás,independente do que acontecesse na ONU, situação bem retratada no filme "W" de Oliver Stone.

Mas há vozes dissonantes: um artigo do jornal britânico "The Guardian" elogiou o acordo, classificando-o de positivo para todos, "exceto para aqueles em Washington e Tel Aviv que procuram desculpas para isolar ou atacar o Irã".O texto afirma que o evento foi a "estreia de uma nova força no cenário mundial, o eixo Brasil e Turquia".
Os dois países estariam "emergindo como a força global pelo compromisso e o diálogo que o movimento não alinhado nunca conseguiu ser".

Na Espanha, o "El País" diz que a consequência mais imediata do acordo "não será traduzida em termos nucleares, mas políticos, com um notável respaldo para a Turquia e em especial, para Luiz Inácio Lula da Silva".

O jornal diz que o Irã também sai fortalecido politicamente, já que o poder de nações não alinhadas parece ter sido prestigiado com o acordo. Além disso a China e a Rússia, que vêm relutando em aplicar as novas sanções, poderiam se basear no acordo para declarar as conversas sobre punições encerradas.

Para o "The New York Times", o presidente dos EUA, Barack Obama, tem agora em suas mãos uma decisão importante: se ele ignorar o acordo, pode emitir sinais de que está rejeitando termos muito parecidos aos que se dispôs a aceitar há oito meses, quando o Irã rejeitou a proposta francesa na última hora.

Por outro lado, se aceitar, muitos dos assuntos urgentes que deveriam ser discutidos com o Irã nos próximos meses (a maioria relacionados às suspeitas de produção da bomba atômica) terão que ser colocados de lado por pelo menos um ano ou mais.

Nenhum comentário:

Postar um comentário